Por Marcel Gomes
São Paulo – Apesar do discurso de lideranças tucanas, a política de privatização do governo federal na era Lula-Dilma possui características distintas daquela realizada na administração de Fernando Henrique Cardoso.
Nesta quarta-feira (8), FHC defendeu, após o leilão dos aeroportos de Guarulhos, Campinas e Brasília, que “privatização não é uma questão ideológica”. No Congresso, parlamentares do PT e do PSDB deram início a uma guerra de palavras.
Para uns, o governo petista fez o mesmo que o tucano, apesar do discurso antiprivatização da campanha. Para outros, o modelo de concessão de aeroportos não privatiza um bem público, uma vez que o governo manterá parcela acionária e o retomará em no máximo 30 anos.
Ainda que se aceite essa ponderação, é inegável que o governo abriu mão de boa parte do controle de três dos terminais mais importantes do país. Privatizou, ainda que temporariamente. Mas também é inegável que fez isso de maneira distinta do que ocorrera no passado.
No cerne da questão estão a abrangência das operações realizadas e o papel que se deseja para o Estado no ordenamento econômico. Na era FHC, a privatização era uma estratégia-chave para alterar as funções do Estado brasileiro na economia.
Com as estatais endividadas, avaliava-se que a capacidade de o Estado promover investimentos, tarefa historicamente cumprida, estava abalada, tornando-se fundamental impulsionar o setor privado. Era necessário por fim à era Vargas, dando um choque de capitalismo ao Brasil.
“Na redefinição do papel do Estado, caberá ao setor privado uma presença significativa, sobretudo nos investimento em infra-estrutura”, escreveu FHC em seu programa de governo lançado como livro em 1994, o “Mãos à obra, Brasil”.
Ritmo acelerado
Em 1995, FHC, em seu primeiro ano no poder, criou o Conselho Nacional de Desestatização, com o objetivo de acelerar a execução do Programa Nacional de Desestatização (PND), gestado como lei ainda no governo Collor.
A Usiminas já havia sido vendida em 1991. Em seu projeto de reforma, FHC incluiu no PND companhias públicas dos setores de eletricidade, transportes e telecomunicações, além de uma das jóias da coroa, a Vale do Rio Doce – que acabou negociada em 1997.
Nesse mesmo ano, o governo intensifica o uso do BNDES como financiador da desestatização, inclusive de empresas estaduais. E aprova a Lei Geral de Telecomunicações, abrindo o mercado aos estrangeiros.
A marcha privatizadora seguiu por 1998, com as vendas do terminal de contêineres do Porto de Sepetiba (RJ), das Centrais Elétricas Geradoras do Sul e da malha ferroviária paulista.
Em 1999, foi a vez de novas concessões na área de telecom, da Datamec (empresa de processamento de dados) e do porto de Salvador. Em 2000, do Banespa e das ações que excediam o controle acionário detido pela União na Petrobras.
Até 2002, último ano de FHC no Planalto, à União arrecadou cerca de US$ 31 bilhões com todo o processo de privatização, em valores da época calculados pelo BNDES, somando entrada de recursos e transferência de dívidas.
Pé no freio
A partir de 2003, com o fim do ciclo tucano e o início do governo Lula, a privatização saiu do primeiro plano da agenda nacional. Entretanto, jamais deixou de ser executada, no sentido de concessão a agentes privados da execução de obras e de serviços antes públicos.
A estratégia, porém, foi restrita a alguns setores do governo, em especial o elétrico. Essa área era comandada pela então ministra da Minas e Energia Dilma Rousseff, que permaneceu no cargo até ser promovida à Casa Civil, em junho de 2005.
Era um sinal de que a atual mandatária confiava em parcerias com o setor privado. Ainda em 2003, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) manteve a outorga de concessões para exploração de empreendimentos de transmissão incluídos no PND. Foram leiloadas onze linhas de transmissão em oito Estados, gerando investimentos de R$ 1,8 bilhão, em valores da época.
No ano seguinte, o governo Lula foi alvo de críticas de uma de suas bases mais tradicionais, os trabalhadores bancários, por leiloar o Banco do Estado do Maranhão (BEM). O comprador foi o Bradesco. Em 2005, foi a vez de o Banco do Estado do Ceará (BEC) ser alienado, também para o Bradesco.
Em 2006, o governo incluiu no PND as instalações de transmissão de energia elétrica da Rede Básica do Sistema Elétrico Interligado Nacional. A outorga de concessões para exploração de empreendimentos de transmissão continuou.
Transportes privatizados
Em 2007, o sistema de concessões foi absorvido pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que licitou 2,6 mil Km de rodovias federais. De modo distinto às administrações tucanas, a estratégia foi negociar tarifas de pedágio menores. Também data desse ano o decreto que inclui no PND o trem-bala entre Campinas, São Paulo e Rio de Janeiro.
No ano seguinte, foi realizado o leilão da Usina Hidrelétrica Jirau, no rio Madeira, em Rondônia. O vencedor foi o Consórcio Energia Sustentável do Brasil, que teve como preço final ofertado pela energia R$ 71,37/ MWh. Participam do grupo a Suez Energy, Camargo Corrêa, Eletrosul e Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf).
Depois do setor elétrico e das rodovias, foi a vez de o setor aeroportuário entrar no PND, através do Aeroporto Internacional de São Gonçalo do Amarante, no Rio Grande do Norte. Seria o prenúncio dos leilões agora realizados e que resultaram na concessão dos terminais de Guarulhos, Campinas e Brasília.
Ainda que as privatizações de Lula-Dilma tenham deixado o setor elétrico e de telecom e chegado às rodovias e aos aeroportos, sua abrangência permanece reduzida em relação aos sentidos da privatização no governo FHC. O que domina a agenda pública agora é um retorno ao papel planificador do Estado.
Com esse objetivo, o governo federal altera a exploração petrolífera de um regime de concessões para o de partilha, e prepara o Plano Nacional de Banda Larga. Nos aeroportos privatizados, a Infraero manterá parcela acionária para permanecer monitorando as companhias privadas que venceram o leilão. Resta saber como esse novo arranjo na prática se dará.
Fonte:http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19585
Nesta quarta-feira (8), FHC defendeu, após o leilão dos aeroportos de Guarulhos, Campinas e Brasília, que “privatização não é uma questão ideológica”. No Congresso, parlamentares do PT e do PSDB deram início a uma guerra de palavras.
Para uns, o governo petista fez o mesmo que o tucano, apesar do discurso antiprivatização da campanha. Para outros, o modelo de concessão de aeroportos não privatiza um bem público, uma vez que o governo manterá parcela acionária e o retomará em no máximo 30 anos.
Ainda que se aceite essa ponderação, é inegável que o governo abriu mão de boa parte do controle de três dos terminais mais importantes do país. Privatizou, ainda que temporariamente. Mas também é inegável que fez isso de maneira distinta do que ocorrera no passado.
No cerne da questão estão a abrangência das operações realizadas e o papel que se deseja para o Estado no ordenamento econômico. Na era FHC, a privatização era uma estratégia-chave para alterar as funções do Estado brasileiro na economia.
Com as estatais endividadas, avaliava-se que a capacidade de o Estado promover investimentos, tarefa historicamente cumprida, estava abalada, tornando-se fundamental impulsionar o setor privado. Era necessário por fim à era Vargas, dando um choque de capitalismo ao Brasil.
“Na redefinição do papel do Estado, caberá ao setor privado uma presença significativa, sobretudo nos investimento em infra-estrutura”, escreveu FHC em seu programa de governo lançado como livro em 1994, o “Mãos à obra, Brasil”.
Ritmo acelerado
Em 1995, FHC, em seu primeiro ano no poder, criou o Conselho Nacional de Desestatização, com o objetivo de acelerar a execução do Programa Nacional de Desestatização (PND), gestado como lei ainda no governo Collor.
A Usiminas já havia sido vendida em 1991. Em seu projeto de reforma, FHC incluiu no PND companhias públicas dos setores de eletricidade, transportes e telecomunicações, além de uma das jóias da coroa, a Vale do Rio Doce – que acabou negociada em 1997.
Nesse mesmo ano, o governo intensifica o uso do BNDES como financiador da desestatização, inclusive de empresas estaduais. E aprova a Lei Geral de Telecomunicações, abrindo o mercado aos estrangeiros.
A marcha privatizadora seguiu por 1998, com as vendas do terminal de contêineres do Porto de Sepetiba (RJ), das Centrais Elétricas Geradoras do Sul e da malha ferroviária paulista.
Em 1999, foi a vez de novas concessões na área de telecom, da Datamec (empresa de processamento de dados) e do porto de Salvador. Em 2000, do Banespa e das ações que excediam o controle acionário detido pela União na Petrobras.
Até 2002, último ano de FHC no Planalto, à União arrecadou cerca de US$ 31 bilhões com todo o processo de privatização, em valores da época calculados pelo BNDES, somando entrada de recursos e transferência de dívidas.
Pé no freio
A partir de 2003, com o fim do ciclo tucano e o início do governo Lula, a privatização saiu do primeiro plano da agenda nacional. Entretanto, jamais deixou de ser executada, no sentido de concessão a agentes privados da execução de obras e de serviços antes públicos.
A estratégia, porém, foi restrita a alguns setores do governo, em especial o elétrico. Essa área era comandada pela então ministra da Minas e Energia Dilma Rousseff, que permaneceu no cargo até ser promovida à Casa Civil, em junho de 2005.
Era um sinal de que a atual mandatária confiava em parcerias com o setor privado. Ainda em 2003, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) manteve a outorga de concessões para exploração de empreendimentos de transmissão incluídos no PND. Foram leiloadas onze linhas de transmissão em oito Estados, gerando investimentos de R$ 1,8 bilhão, em valores da época.
No ano seguinte, o governo Lula foi alvo de críticas de uma de suas bases mais tradicionais, os trabalhadores bancários, por leiloar o Banco do Estado do Maranhão (BEM). O comprador foi o Bradesco. Em 2005, foi a vez de o Banco do Estado do Ceará (BEC) ser alienado, também para o Bradesco.
Em 2006, o governo incluiu no PND as instalações de transmissão de energia elétrica da Rede Básica do Sistema Elétrico Interligado Nacional. A outorga de concessões para exploração de empreendimentos de transmissão continuou.
Transportes privatizados
Em 2007, o sistema de concessões foi absorvido pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que licitou 2,6 mil Km de rodovias federais. De modo distinto às administrações tucanas, a estratégia foi negociar tarifas de pedágio menores. Também data desse ano o decreto que inclui no PND o trem-bala entre Campinas, São Paulo e Rio de Janeiro.
No ano seguinte, foi realizado o leilão da Usina Hidrelétrica Jirau, no rio Madeira, em Rondônia. O vencedor foi o Consórcio Energia Sustentável do Brasil, que teve como preço final ofertado pela energia R$ 71,37/ MWh. Participam do grupo a Suez Energy, Camargo Corrêa, Eletrosul e Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf).
Depois do setor elétrico e das rodovias, foi a vez de o setor aeroportuário entrar no PND, através do Aeroporto Internacional de São Gonçalo do Amarante, no Rio Grande do Norte. Seria o prenúncio dos leilões agora realizados e que resultaram na concessão dos terminais de Guarulhos, Campinas e Brasília.
Ainda que as privatizações de Lula-Dilma tenham deixado o setor elétrico e de telecom e chegado às rodovias e aos aeroportos, sua abrangência permanece reduzida em relação aos sentidos da privatização no governo FHC. O que domina a agenda pública agora é um retorno ao papel planificador do Estado.
Com esse objetivo, o governo federal altera a exploração petrolífera de um regime de concessões para o de partilha, e prepara o Plano Nacional de Banda Larga. Nos aeroportos privatizados, a Infraero manterá parcela acionária para permanecer monitorando as companhias privadas que venceram o leilão. Resta saber como esse novo arranjo na prática se dará.
Fonte:http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19585
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