Parece-nos, então, que não há dúvidas de que os ataques do World Trade Center, de Madri e de Londres foram indiscutivelmente ataques terroristas. Entretanto, quem citou um desses três como o maior ataque terrorista de toda a história, passou bem longe! Na verdade, mesmo se pudéssemos considerar os três como um único ataque, isso não seria suficiente para considerá-lo como o maior de todos. O maior ataque terrorista da história da humanidade ocorreu em duas etapas: o primeiro em 06 de agosto de 1945 na cidade de Hiroshima (com 140 mil mortos) e o segundo em Nagasaki (com 80 mil mortos), ambos ocorridos no Japão. É bom não esquecermos também que, nesses dois casos, não havia nenhum muçulmano envolvido. Muito pelo contrário, quem comandou e ordenou os dois ataques com bombas nucleares à população civil japonesa vestia terno e gravata, tinha a pele branca, olhos claros, se dizia cristão e, no momento dos ataques, ocupava o cargo de presidente dos Estados Unidos: o Sr. Harry S. Truman.
Seja terrorismo de Estado ou terrorismo efetuados por pequenos grupos independentes, ambos são terrorismo e a sua essência é a mesma: causar o máximo de terror e pânico na população para tirar proveitos políticos (neste caso, os Estados Unidos tinham como interesse não acabar com a guerra, mas mostrar para o mundo, e principalmente para a União Soviética, a sua supremacia militar). Aliás, os Estados Unidos são, dentre todos os países que detém um arsenal bélico nuclear, o único país do mundo que se utilizou desse armamento para atacar outro país, ou melhor, a população civil de outro país, no caso o Japão.
Mas as atividades estadunidenses não se resumem apenas ao terrorismo. Além de deterem esse “honrado” título de maiores terroristas mundiais, os Estados Unidos são também os maiores produtores de armas e artefatos de guerra no mundo e, consequentemente, os maiores traficantes de armas também (o complexo militar-industrial-acadêmico é responsável por empregar cerca de 30% da população economicamente ativa nos Estados Unidos). Outras atividades peculiares dos estadunidenses são os assassinatos de líderes políticos de outros países que se posicionam contrários aos seus interesses como foi o caso, por exemplo, de Patrice Émery Lumumba (nascido no Congo Belga, 2 de Julho de 1925 – morto em Katanga, 17 de Janeiro de 1961). Lumumba foi um lider anti-colonial e primeiro-ministro eleito em junho de 1960 na actual República Democrática do Congo depois de ter participado da conquista da independência do Congo Belga em relação à Bélgica. Passadas apenas dez semanas da sua eleição, foi deposto juntamente com o seu governo num golpe de estado, aprisionado e assassinado (seu corpo foi esquartejado e dissolvido em ácido para que não deixasse vestígios) em janeiro de 1961, em circunstâncias que indicaram provável cumplicidade e apoio dos governos da Bélgica e dos Estados Unidos. Num exemplo mais recente, temos o caso da descoberta de um plano para assassinar o presidente da Bolívia Evo Morales, eleito democraticamente, que seria posto em prática por grupos para-militares bolivianos, patrocinados material e financeiramente pelos Estados Unidos, para aplicarem um golpe de estado naquele país. Aliás, entre as décadas de 1960 e 1970 não houve um único golpe de estado na América Latina que não tivesse o envolvimento direto ou indireto dos Estados Unidos. Mas como são inúmeros os exemplos, vamos citar apenas mais um que, além de atual, é extremamente emblemático para o entendimento do pensamento, das ações e dos interesses imperialistas dos dias de hoje: o caso do Irã.
Para entendermos melhor a questão do Irã, devemos começar por saber um pouco da história desse país. Somente depois disso conseguiremos entender o quanto de hipocrisia, mentira e cinismo está inexoravelmente ligado às críticas e à campanha que está sendo vinculada contra o povo iraniano, e que acaba por esconder os verdadeiros motivos de tal campanha: o interesse pelo ouro negro (petróleo) e a estratégia geopolítica dos Estados Unidos no Oriente Médio.
Em 1953, Mohammed Mossadegh, primeio-ministro do Irã, eleito democraticamente em 1951, foi deposto por um golpe de Estado orquestrado e financiado pela CIA (Central de Inteligência Americana). Mossadegh gozava de enorme popularidade entre o povo iraniano, pois era considerado um grande nacionalista. Foi durante seu mandato que houve a nacionalização da empresa petrolífera Anglo-Iranian Oil Company (corporação britânica que explorava a extração de petróleo no país) que, primeiramente, desagradou a Inglaterra e logo em seguida também aos Estados Unidos. Mossadegh foi então afastado do poder, detido e condenado à prisão por três anos, e após sua libertação passou o resto dos seus dias em prisão domiciliar. Em seu lugar, assumiu um ditador e fantoche dos Estados Unidos, Mohammed Reza Pahlavi. O governo do xá Reza Pahlavi foi caracterizado por massacres contra os opositores ao regime ditatorial, lançando mão de assassinatos em massa e tortura sempre tendo o apoio político, material e financeiro dos Estados Unidos. Era também considerado pela grande maioria do povo iraniano como um traidor das tradições iranianas e das Leis islâmicas. Além disso, a miséria e a desigualdade crescentes entre o povo iraniano durante seu governo fomentou ainda mais a insatisfação e a indignação contra o regime do xá, o que ocasionou crescentes movimentos para a sua derrubada do poder, e que culminou naquilo que ficou conhecido como a Revolução Islâmica Iraniana, em 1979. Com a Revolução, o xá Reza Pahlavi abandona o país e busca asilo nos Estados Unidos que, obviamente, o recebeu de braços abertos. Entretanto, devido a essa receptividade do governo estadunidense, ocorreu a expulsão da sua embaixada do Irã e a detenção de 53 americanos que passaram à condição de reféns para pressionar os Estados Unidos a liberar cerca de 23 bilhões de dólares de dinheiro iraniano em contas estadunidenses (a negociação durou 444 dias e foi resolvida de forma bastante obscura, pois não se divulgou de que forma foi conseguida a libertação dos reféns pelo governo estadunidense, que começou no governo Jimmy Carter e terminou no governo de Ronald Reagan). A Revolução Islâmica Iraniana, portanto, que teve como seu líder de maior expressão, Ruholla Khomeini (após a Revolução ganhou o estatuto de aiatolá, que significa perito em religião e direito) foi o acontecimento que deu as características que até hoje regem o regime político e social do Irã (uma Teocracia fundamentada no Alcorão, o livro sagrado da religião islâmica).
Outro acontecimento interessante e que retrata bem a ética estadunidense ocorreu durante a guerra do Irã contra o Iraque (1980-1988). Nessa época como vimos, o Irã já era considerado um inimigo, o que levou os Estados Unidos a apoiar material e financeiramente o Iraque do então já ditador, porém naquela época aliado, Saddam Hussein. Entretanto, isso não fez com que os Estados Unidos perdessem uma grande oportunidade de fazer negócios com o próprio Irã: o presidente Ronald Reagan simplesmente passou a vender armas também para os iranianos (escândalo que ficou conhecido como Irã-Contras).Tendo como pilar de sustentação de sua economia o Complexo Militar-industrial-acadêmico, esse tipo de comportamento mercenário acaba por tornar-se rotineiro. Não foi diferente com os Talibãs no Afeganistão, onde os Estados Unidos também financiaram, armaram e treinaram esse grupo de guerrilheiros para que eles derrotassem a União Soviética (o que de fato aconteceu). E hoje esses mesmos Talibãs são considerados, pelos Estados Unidos, como um grupo de terroristas.
Bem, agora os Estados Unidos bradam aos quatro ventos que o Irã é a grande ameaça à paz mundial (e fica a pergunta: que paz?!), pois o Irã pretende construir a sua bomba atômica (seria essa bomba do mesmo tipo que, segundo o presidente G.W. Bush e sua gangue, disseram que havia no Iraque?). Devemos lembrar que o Irã, ao contrário de Israel, que sequer permite a fiscalização da Agência Internacional de Energia Atômica em seu território, é signatário do acordo internacional de não-proliferação de armas nucleares. Mas mesmo assim, é o Irã que é considerado como uma grande ameaça, enquanto Israel é considerado um aliado na luta pela paz. Historicamente, não é Irã que tem o hábito de invadir o território de outros países, desrespeitar acordos e leis internacionais e, com uma política tipicamente Nazista, tenta a todo custo exterminar o povo palestino.
Na última e mais recente campanha midiática contra o Irã, faz-se a acusação de que neste país aplicam-se métodos bárbaros para a aplicação da pena de morte – neste caso específico, trata-se de uma mulher que está condenada à pena de apedrejamento até a morte por ter traído seu marido e também por ter participado de seu assassinato. E aí vem outra pergunta: existe pena de morte civilizada e humana? Se fosse possível, deveríamos perguntar pra quem já cumpriu esse tipo de condenação. A pena de morte não é por si só uma barbárie independentemente do método que se utilize? A cadeira elétrica, a injeção letal (comumente usadas nos Estados Unidos, onde cerca de 70% daqueles que são executados são negros e latinos) podem ser consideradas como justas e civilizadas? Por que os Estados Unidos não tentam interferir também na Arábia Saudita, onde não há um único resquício de democracia e também há pena de morte por enforcamento, decapitação, etc.? Em 2006, na Arábia Saudita, uma mulher foi condenada à morte acusada de bruxaria. Sendo que no ano anterior, em 2005, um homem já havia sido condenado e decapitado também pela acusação de práticas de bruxaria. Seria porque a Arábia Saudita atende de forma total e subserviente aos interesses estadunidenses? E o que dizer das prisões de Guantánamo em Cuba, de Bagram no Afeganistão e de Abu Ghraib no Iraque (todas controladas pelos Estados Unidos), onde estão mais do que comprovados os constantes desrespeitos aos direitos humanos, às leis internacionais, além das constantes e mais diversas e perversas práticas de tortura contra os prisioneiros? Malcolm X (1925-1965), um dos maiores defensores dos direitos dos negros nos Estados Unidos, e que morreu assassinado, já sabia qual era a resposta que daria solução para o seu país. Dizia ele:
“Por que o negro precisa de lei para provar que é ser humano? O branco não precisa provar que é ser humano. Digo isso pelo seguinte: nós nunca teremos liberdade real entre brancos e negros nesse país sem destruir esse país, sem destruir o atual sistema político, sem destruir o atual sistema econômico, sem reescrever a Constituição inteira, sem destruir tudo o que os Estados Unidos supostamente defendem.”
E completava: “Vou me unir com qualquer um, de qualquer cor, desde que eles queiram acabar com a miséria desta Terra.”
Diante de tudo isso, nos resta apenas concluir com uma última pergunta: e você, tem medo do Irã?
*Renato Prata Biar é historiador, pós-graduado em filosofia. Mora no Rio de Janeiro e é colaborador do blog “Quem tem medo do Lula?”.
A charge é uma cortesia do cartunista Bira Dantas, também colaborador do blog "Quem tem medo do Lula?"
Fonte: http://quemtemmedodolula.blogspot.com/2010/08/e-voce-tem-medo-do-ira.html
A charge é uma cortesia do cartunista Bira Dantas, também colaborador do blog "Quem tem medo do Lula?"
Fonte: http://quemtemmedodolula.blogspot.com/2010/08/e-voce-tem-medo-do-ira.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário