quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Os problemas do bolsa-família americano

A direita brasileira adora falar mal do Bolsa-Família.
Tenta fazer crer que é uma invenção do populismo e do assistencialismo tipicamente latino-americanos. Sempre vem com aquela conversa mole:
– Só no Brasil mesmo!
Viaja, mas não aprende.
Todo país com alguma seriedade e certo grau de riqueza tem Bolsa-Família.
A Europa desenvolvida tem diversas modalidades de ajuda social.
Nem a liberal Inglaterra escapa.
Os Estados Unidos, apesar da oposição ferrenha do direitismo republicano, seguem a mesma balada. Distribuem bolsa-família, enfrentam os efeitos perversos produzidos por esse mecanismo, convivem com a crítica fácil ao assistencialismo, não sabem como inserir os beneficiados no mundo do trabalho – pois falta emprego – e tocam em frente do jeito que dá.
Podiam aprender com o Brasil cujo modelo é mais avançado.
O modelo americano privilegia o analfabetismo em certos casos.
O brasileiro obriga a estar na escola.
A direita brasileira americanófila não conta essa parte.
Vai um artigo direitoso do New York Times, publicado pelo UOL, como presente de fim de ano para a turma que adora os leopardos desdentados de plantão na mídia nacional, os Pondé, Demétrio Magnoli, Marco Antônio Villa, Merval Pereira, Ricardo Noblat, Ferreira Gullar, Ricardo Setti, Lauro Jardim, Dora Krammer, Eliane Cantanhede e outros felinos que usaram as patinhas para publicar centenas de textos com ou sem marcas de presas, fazendo-se de autônomos por corresponderem plenamente à ideologia visionária dos seus patrões e aos interesses isentos dos seus veículos, sendo pisoteados o tempo todo pelo talento e a independência de Jânio de Freitas, Elio Gaspari, Clóvis Rossi, Carlos Heitor Cony, Paulo Henrique Amorim e até do eterno, barroco, permanente e irrefreável Mino Carta, um italiano casca grossa que tenta ser romancista em português com a leveza, a elegância, a sutileza e os passos de balé de um tigre aposentado.
A mídia brasileira é sempre a mesma. O promissor Alberto Dines, seguindo o refrão dos colegas mais experientes e acompanhando o tom dos patrões, logo depois do golpe de 1º de abril de 1964, atolando-se em elogios aos golpistas: “Golpe ou contragolpe? Minas marcha contra Goulart. Enfim, apareceu um homem para dar o primeiro passo. Este homem é o mais tranquilo, o mais sereno de todos os que estão na cena política. Magalhães Pinto, sem muitos arroubos, redimiu os brasileiros da pecha de impotentes”.
Só não era a origem do PIG por ser uma continuação do jornalismo lacerdinha.
Nada mudou.
Só o meu espírito de final de ano.
Feliz 2013!
*

Para continuar em programa de assistência a deficientes intelectuais, famílias carentes mantêm analfabetismo dos filhos nos EU

The New York Times Nicholas D. Kristof
Em Jackson, Kentucky (EUA
  • Jonathan Palmer/The New York Times Courtney Trent (dir.), da Save the Children, realiza visitas domiciliares a mães carentes nos EUA, com o  propósito de ajudá-las a estimular as habilidades de que elas necessitam para desempenhar a tarefa de criar um filho. As visitas domiciliares se iniciam durante a gravidez e continuam até que a criança complete 3 anos de idadeCourtney Trent (dir.), da Save the Children, realiza visitas domiciliares a mães carentes nos EUA, com o propósito de ajudá-las a estimular as habilidades de que elas necessitam para desempenhar a tarefa de criar um filho. As visitas domiciliares se iniciam durante a gravidez e continuam até que a criança complete 3 anos de idade
Às vezes, a cara da pobreza nos Estados Unidos se apresenta dessa forma: pais da região montanhosa dos Apalaches retirando seus filhos das aulas de alfabetização. As mães e os pais dessa parte do país temem que, caso seus filhos aprendam a ler, eles terão uma probabilidade menor de se qualificar para receber o cheque mensal entregue àqueles que têm algum tipo de deficiência intelectual.
Muitas das pessoas que moram em casas móveis nas encostas locais são pobres e desesperadas, e o cheque mensal no valor de US$ 698 por criança, pago pelo programa de Renda Previdenciária Suplementar, representa uma ajuda e tanto – e esses pagamentos continuam sendo enviados às famílias até que a criança complete 18 anos.
“As crianças são retiradas do programa de alfabetização porque os pais podem perder o cheque caso elas continuem”, disse Billie Oaks, que dirige um programa de alfabetização em Breathitt County, região pobre do Estado norte-americano do Kentucky. “É de partir o coração”.
É doloroso para um liberal admitir isso, mas os conservadores têm razão quando sugerem que a rede de proteção social norte-americana pode ocasionalmente aprisionar as pessoas em uma dependência avassaladora. Nossos programas de combate à pobreza resgatam muitas pessoas da miséria, mas, às vezes, produzem efeitos negativos.
Alguns jovens dessa região não servem as forças armadas (que representam a rota de fuga tradicional para os norte-americanos pobres e residentes em áreas rurais), pois é mais fácil contar com os vales-alimentação e os pagamentos relacionados a deficiências.
Os programas de combate à pobreza também desestimulam o casamento: em um programa como o como o Renda Previdenciária Suplementar, cujo critério básico repousa sobre as condições financeiras dos beneficiários, uma mãe que esteja criando seu filho pode receber uma quantia maior do governo se não se casar com aquele cara trabalhador de quem ela gosta. No entanto, o casamento é uma das melhores saídas para reduzir a pobreza. Nas casas mantidas por casais, apenas uma criança em 10 cresce na pobreza, enquanto que, nas casas mantidas apenas pela mãe, quase a metade das crianças cresce na pobreza.
Mais angustiante ainda são os pais que acreditam que é melhor que a criança permaneça analfabeta, pois, assim, a família conseguirá reivindicar um cheque-deficiência todos os meses.
“Uma das maneiras de entrar para esse programa é ter problemas na escola”, observa Richard V. Burkhauser, economista da Universidade de Cornell, um dos autores de um livro sobre os programas de subsídio a deficientes lançado no ano passado. “Se você vai bem na escola, você ameaça a renda dos pais. É um incentivo terrível”.
Aproximadamente quatro décadas atrás, a maior parte das crianças abrangidas pelo programa de Renda Previdenciária Suplementar tinha graves deficiências físicas ou retardo mental, condições que dificultavam que seus pais se mantivessem empregados. E elas perfaziam cerca de 1% de todas as crianças pobres dos EUA. Mas, atualmente, 55% das deficiências que o programa abrange são incapacidades intelectuais um tanto indefinidas, que não chegam a configurar retardo mental e para as quais o diagnóstico é menos claro. Mais de 1,2 milhão de crianças norte-americanas – um total de 8% de todas as crianças de baixa renda – estão atualmente inscritas no programa de Renda Previdenciária Suplementar como deficientes, o que gera um custo anual de mais de US$ 9 bilhões.
É claro que isso é um fardo para os contribuintes, mas pode ser ainda pior para as crianças cujas famílias têm um interesse enorme em seu fracasso escolar. Essas crianças podem não se recuperar nunca mais: um estudo de 2009 descobriu que, quando completam 18 anos, quase dois terços dessas crianças fazem a transição para o programa de Renda Previdenciária Suplementar para adultos deficientes. Elas podem nunca chegar a ter um emprego durante toda a vida e estão condenadas a uma existência de pobreza patrocinada pelo seguro-desemprego – e esse é o resultado de um programa destinado a combater a pobreza.
Não há dúvida de que, para algumas famílias que têm crianças com graves deficiências, receber os cheques do programa Renda Previdenciária Suplementar é vital. Mas a conclusão é que não deveríamos tentar combater a pobreza com um programa que, às vezes, é usado para perpetuá-la.
Uma funcionária do distrito escolar local, Melanie Stevens, explica a situação da seguinte maneira: “O maior desafio que enfrentamos no papel de educadores é descobrir como conseguiremos quebrar essa dependência do governo. Na segunda série, eles têm um sonho. Na sétima série, eles têm um plano”.
Sempre há o perigo de tirarmos conclusões inflexíveis demais a respeito de um problema – o combate à pobreza – que é tão complexo quanto os próprios seres humanos. Eu não sou especialista em pobreza doméstica. Mas, para mim, uma lição empírica que se pode tirar dessa questão é a seguinte: apesar de precisarmos de redes de seguridade social, o foco deve se voltar para a geração de oportunidades – e, o que é ainda mais difícil, para a criação de um ambiente que faça com que as pessoas aproveitem as oportunidades que lhes são apresentadas.
Para tentar descobrir o que isso pode significar, eu acompanhei o trabalho da Save the Children, uma organização de assistência que, na cabeça da maioria de nós, atua apenas em países como Sudão ou Somália. Mas a Save the Children também atua para criar oportunidades aqui nos Estados Unidos, em lugares como a casa móvel de Britny Hurley – e a organização oferece um modelo daquilo que realmente funciona.
Hurley, 19, é amável e fala rapidamente com um forte sotaque das colinas, de maneira que, às vezes, eu tinha dificuldade para entendê-la. Hurley diz que ela foi estuprada por um membro de sua família quando tinha 12 anos, e que, em seguida, outro membro da família a apresentou aos narcóticos. Hurley diz que ficou viciada principalmente em analgésicos, que são amplamente traficados na região.
Dotada de uma inteligência afiada, Hurley já quis ser médica. Mas seus vícios e sua natureza rebelde fizeram com que ela fosse expulsa da escola durante o ensino fundamental. E, aos 16 anos, ela se envolveu com um namorado e logo teve um bebê.
No entanto, existem formas de quebrar esse ciclo. Isso é o que a Save the Children está fazendo na região: a organização trabalha com as crianças enquanto elas ainda são maleáveis, numa abordagem que deve funcionar como peça central do programa de combate à pobreza dos EUA. Quando a questão é pobreza, a resposta quase sempre está nas crianças.
A Save the Children treina membros da comunidade para que façam visitas domiciliares a mães em situação de risco, como Hurley, e para que ajudem a estimular as habilidades de que elas necessitam para desempenhar a tarefa mais difícil do mundo: a tarefa de criar um filho. Essas visitas domiciliares se iniciam durante a gravidez e continuam até que a criança complete 3 anos de idade.
Acompanhei Courtney Trent, 22, que é uma das coordenadoras do programa para a primeira infância, em suas visitas a várias casas. Ela incentiva as mães (e os pais, caso eles estejam por perto) a ler para as crianças, a contar histórias, a conversar com elas e a abraçá-las. Se os pais não sabem ler, Trent os estimula a virar as páginas de livros ilustrados e falar sobre o que estão vendo.
Em cada visita, Trent leva alguns livros – e traz de volta aqueles que havia deixado em sua visita anterior. Muitas das casas visitadas por ela não possuem nenhum livro infantil.
Ela se sentou no chão da sala de estar de Hurley, tirou um livro de sua bolsa e incentivou-a a ler para seu filho de 20 meses, Landon. Hurley disse que, quando ela era criança, ninguém nunca leu para ela. E afirmou que está determinada a mudar esse padrão.
“Eu só quero que ele vá para a escola”, disse ela a respeito de Landon. “Eu quero que ele vá para a faculdade e que saia deste lugar”. Hurley disse que não está mais usando drogas e que está trabalhando em tempo integral em uma lanchonete fast food da rede Wendy’s. Além disso, ela espera voltar para a escola e se formar enfermeira. Eu apostaria nela – e em Landon.
“Quando as crianças vêm até nós por meio desse programa e frequentam nossa escola, conseguimos perceber uma grande diferença”, disse Ron Combs, diretor da escola primária Lyndon B. Johnson, também localizada na região dos Apalaches. “Dessa forma, elas ficam realmente preparadas. Caso contrário, as crianças ficam tão atrasadas que têm dificuldade para se recuperar depois”.
“Quando elas estão no segundo ou no terceiro ano do ensino básico, já dá para ter uma boa ideia de quem vai abandonar a escola”, acrescentou ele.
Um grupo de professores estava na sala enquanto eu conversava com Combs, e todos eles concordaram com as afirmações do diretor. Wayne Sizemore, diretor de educação especial em Breathitt County, explica a situação dessa forma: “Quanto mais cedo nós conseguirmos atraí-los, melhor. É como construir o alicerce de uma casa”.
Eu não pretendo sugerir que os programas de combate à pobreza dos EUA são um fracasso total. Pelo contrário, eles estão fazendo uma diferença significativa. Hoje, quase todas as casas aqui da região montanhosa dos Apalaches têm energia elétrica e água corrente, e as pessoas não estão morrendo de fome.
O nosso sistema político criou uma rede de seguridade social especialmente sólida para os idosos, com foco na Previdência Social e no Medicare, pois os idosos votam. Essa rede de seguridade social fez baixar a taxa de pobreza entre os idosos de aproximadamente 35% em 1959 para menos de 9% hoje em dia.
Como as crianças não têm voz política, elas têm sido negligenciadas – e substituíram os idosos como o grupo etário mais pobre de nosso país. Hoje, 22% das crianças vivem abaixo da linha da pobreza.
Entre as famílias norte-americanas que hoje vivem na pobreza, oito de cada 10 têm ar condicionado e a maioria tem máquina de lavar e secadora. Quase todas as famílias têm fornos de micro-ondas. O que elas não têm é esperança. Dá para perceber isso aqui na cidade de Jackson, nas adolescentes que circulam pela ponte localizada sobre a bifurcação norte do rio Kentucky. Nesse local, elas tentam negociar seus corpos em troca de analgésicos ou metanfetaminas.
Um crescente conjunto de pesquisas realizadas com bastante rigor sugere que a estratégia mais eficaz para evitar esse tipo de situação é trabalhar desde cedo com as crianças e investir em sua educação – além de tentar estimular e apoiar o casamento. Aplausos ao prefeito Juliano Castro, de San Antonio, por ele ter apoiado uma iniciativa que se tornou referência: Castro determinou a adição de um oitavo de 1% ao imposto de consumo local para financiar um programa de pré-jardim de infância. Intervenções precoces não são uma bala de prata, e até mesmo programas que se mostram bem-sucedidos durante fases experimentais muitas vezes não funcionam quando ampliados para públicos maiores. Mas nós acabamos pagando pela pobreza de uma maneira ou de outra, e a educação precoce, adotada já na primeira infância, é muito mais barata do que o encarceramento de adultos. Eu espero que as negociações orçamentárias realizadas em Washington sejam capazes de nos oferecer uma oportunidade para retirar dinheiro do programa de Renda Previdenciária Suplementar e, em vez disso, investir em iniciativas de educação infantil. Uma das razões pelas quais as iniciativas anti-pobreza não avançam nos EUA é o fato de a questão ser simplesmente invisível.
“As pessoas não querem falar sobre a pobreza na América”, disse Mark Shriver, que gerencia os programas nacionais da Save the Children, enquanto percorríamos o estado do Kentucky. “Falamos mais sobre a pobreza na África do que sobre a pobreza na América”.
Na verdade, durante a campanha eleitoral de 2012, a questão da pobreza quase não foi mencionada. Um estudo realizado pela Fairness & Accuracy in Reporting, órgão de fiscalização liberal, conseguiu detectar discussões sérias a respeito da pobreza em apenas 0,2% das notícias de campanha.
Não existe uma solução mágica para a questão, e ajudar as pessoas é difícil. Uma mulher que conheci, Anastasia McCormick, me disse que seu carro de US$ 500 havia quebrado e que ela tinha de caminhar mais de 6 km para ir e voltar do trabalho em uma pizzaria. E essas caminhadas vão ficar cada vez mais difíceis, pois ela está grávida de gêmeos que devem nascer em abril.
Em algum momento da gravidez, McCormick não será capaz de manter seu emprego e, então, terá dificuldade para pagar suas contas. Ela alugou uma máquina de lavar roupa e uma secadora, mas está com os pagamentos atrasados e, por isso, os aparelhos poderão ser retirados de sua casa em breve. “Eu recebi um aviso de que eles vão cortar o fornecimento de energia elétrica para a minha casa”, acrescentou ele, “mas, quando isso acontece, eles dão um mês para que a gente pague a conta”. A vida dela é assim, uma montanha-russa que foi construída, em parte, por ela mesma.
Eu não quero descartar ninguém, mas admito que os esforços para ajudar McCormick podem ter um resultado não muito claro. E quanto aos gêmeos que ela está esperando? Há tempo para transformar a vida deles, e eles – assim como milhões de crianças como eles – devem ser uma prioridade nacional. Eles são pequenos demais para fracassar.

Fonte: http://www.correiodopovo.com.br/blogs/juremirmachado/?p=3707

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