sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Desafios e caminhos a seguir

Por Leno Miranda

"A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar"¹ (Eduardo Galeano)

Vivemos um período importante na história do nosso país. Após 500 anos de exploração desenfreada e submissão aos ditames externos, um partido – que é o maior instrumento político já construído por trabalhadoras e trabalhadores desse país – consegue colocar um operário na presidência da república. Sem sombra de dúvidas, a vitória de 2002 foi uma escolha acertada e uma conquista inegável para o Brasil - é só imaginar o que seria o país com a continuação da dupla “demo-tucana” no governo, com seu receituário neoliberal e sua mentalidade de aceitação colonizada, dando prosseguimento a políticas impostas, que fizeram com que os países “de primeiro mundo” quebrassem, hoje, com a crise mundial. O país avançou muito, principalmente no que diz respeito à atenção dada aos mais pobres e à inclusão social. Condições mínimas de dignidade foram garantidas pelo governo para quem mais precisa e, é visível que a vida das brasileiras e dos brasileiros melhorou.

Pela primeira vez na história temos mais de cinquenta por cento da população acima da classe média no Brasil. Enquanto o velho mundo e os EUA adotam medidas severas de austeridade – corte de gasto público, corte e diminuição de salários, demissão de funcionários públicos, aumento de impostos, corte de direitos trabalhistas, etc. – o Brasil, apesar dos atuais cortes de gastos públicos, vai aumentar significativamente o seu salário mínimo², não deixa de olhar pelo social e estuda corte de impostos. O desemprego bate recorde nos “países de primeiro mundo”, enquanto aqui a situação é praticamente inversa.

Porém, mesmo com os avanços conquistados, não podemos nos esquecer que ainda vivemos no modo de produção capitalista. Sistema esse que se constrói, dentre outras coisas, através do antagonismo explorados/exploradores, que ocasiona a acumulação de uma parte (minoritária) em detrimento da expropriação da outra. As tentativas de se “amenizar” os efeitos do capitalismo, ou de tentar “humanizá-lo”, são formas de, mesmo que não queiramos referendar a idéia de que “a exploração do homem pelo próprio homem” – e seus desdobramentos – continuem acontecendo.

As ruas do mundo, diante desta ultima crise financeira, apontam que as contradições atuais são tantas – principalmente nessa sua nova roupagem do capitalismo, o neoliberalismo - que o povo está se manifestando. A densidade política e financeira construída ao longo da história pelas potencias européias, e também pelos Estados Unidos - que submeteu todo planeta à exploração, em vários sentidos, para manter um nível de acumulação e poderio econômico, capaz de ditar as regras mundiais, disseminando miséria e desigualdade - está ruindo. A subserviência ao mercado está colocando em cheque o quanto é “perfeito” esse modo de produção. E, por mais que estejamos numa situação “confortável” (no Brasil) hoje, de uma forma ou de outra, essa crise iniciada no norte do mudo, ecoa também para o sul. Por isso, temos que nos preparar, pois as conseqüências podem ser grandes.

Observado isso, poderíamos dizer que estamos diante de outra oportunidade histórica: o Brasil, com sua importância na geopolítica mundial – que ganhou corpo depois do governo petista – poderia ser o pólo catalisador de uma “guinada à esquerda” na política (econômica) mundial. Mas, isso não é tão fácil quanto parece. Primeiro temos que fazer o nosso “dever de casa”, onde possamos garantir que algumas mudanças sejam aplicadas aqui, para que tenhamos um alicerce sólido e, servir de exemplo posteriormente para outros países.

“Dever de casa”

Para se pensar no socialismo, ou em uma sociedade igualitária – e, se a idéia for construir essa sociedade pelo viés democrático, passando pelo processo eleitoral – é necessário que se tenha maioria nos espaços de poder institucionais e, que também se tenha uma ampla aceitação popular ao projeto. A adesão das forças armadas também é importante nesse processo, haja vista o que aconteceu em 1964 – onde a intenção de Jango não era nem o socialismo – e, o apoio que Chavez recebeu na Venezuela em 2001 por parte do seu exército, quando aconteceu uma tentativa de golpe.

Vamos por partes. Primeiro vamos abordar a ocupação dos espaços institucionais – focando o executivo e o legislativo. É fato que tomamos a presidência da república há quase dez anos. Porém, não foi só um partido que conseguiu ganhar a eleição de 2002, foi uma coligação; e, mesmo que fosse só um partido que tivesse ganhado a referida eleição presidencial – fato muito difícil de acontecer – , quem está na presidência não governa sozinho – precisa ter, no mínimo, dois terços em cada câmara para “governar com tranqüilidade”.

O que acontece hoje para que se possa governar? Com base no que foi dito no parágrafo anterior, é necessário que se faça um governo de coalizão – para se ter o maior apoio e sustentação possíveis e se aprove as políticas necessárias.

Se formos fazer uma leitura de conjuntura do congresso nacional, veremos que dentro dos vieses ideológicos, que vão da ultra-direita até a ultra-esquerda, teremos um cenário em sua maioria conservador. Como política é a arte de lhe dar com a pluralidade, a pluralidade presente dentro do congresso tem uma boa parte conservadora. A base aliada do governo de Dilma é grande, por isso a mídia fala que ela tem poder para aprovar o que quiser. Porém, esta base é super heterogênea no sentido ideológico, tendo como maiores aliados numéricos os partidos de centro – que geralmente, para não falar sempre, são fisiologistas. Dentro dessa lógica, para governar tem que se fazer um arco de alianças tão grande – com partidos que tem interesses tão distintos ideologicamente dos nossos – que se consegue avançar minimamente nas bandeiras que a esquerda defende. Sem contar que, nos últimos tempos, devemos admitir que a correlação de forças dentro do congresso tem melhorado bastante, visto momentos anteriores.

Qual seria a solução dentro desse viés político-eleitoral? Conseguir eleger o executivo e, a maioria de esquerda no legislativo. No Brasil, só conseguiríamos isso com um amplo apoio popular, que possibilitasse inclusive fazer uma reforma política progressista. A melhor alternativa em relação a reforma política seria uma constituinte exclusiva – que era a proposta que o PT defendia até pouco tempo. Visto a conjuntura (conservadora) interna do congresso, se forem delegados aos integrantes daquelas casas a tarefa de fazer uma reforma política, corremos o risco de retroceder ao invés de avançar nessa área. O ideal seria que fossem feitas eleições para tanto e que outras pessoas, que não fossem parlamentares, tivessem a tarefa de elaborar essa reforma – dentro de uma série de critérios, inclusive ficar inelegível por 4 anos, para evitar ao máximo que o espaço se torne um palanque político.

Se observarmos com mais calma, veremos que até para se fazer a constituinte exclusiva, precisaríamos de muito apoio popular para aprová-la. Não seria de bom grado que a elite “se ausentaria” desse espaço. Uma grande mobilização nacional seria necessária para que conseguíssemos tal feito. E, a retrospectiva histórica não é animadora: no final da ditadura, onde a mobilização era bem maior do que hoje, a esquerda não conseguiu ter maioria na ultima constituinte e, chegou ao ponto não assinar a Constituição, que hoje é uma das leis, se não a lei, mais progressista do país.

A “pressão interna” no governo já existe – de diversos setores, como os partidos que compõem a base, a pressão da oposição, dos interesses privados defendidos por integrantes de diversos partidos, a pressão de empresas que ajudaram na eleição, etc. Todos os campos que compõem o governo, e quem apoiou as candidaturas, já fazem suas pressões constantes. Mesmo com a dedicação de muitos parlamentares, devido à correlação de forças, muitas vezes é difícil fazer frente a esses interesses. Seria necessária uma pressão popular grande, para que a “pressão externa” também exista de forma constante, forçando nossos representantes a tomarem medidas cada vez maiores em prol do social, e não na defesa de interesses privados.

Em suma, o que se percebe é que é na população em geral que encontramos o ponto de partida. É a sociedade que elege os representantes; é dela que os representantes saem; e (teoricamente) para ela que governam. O número de pessoas em toda sociedade é maior do que todo o aparato institucional. É a população quem detém o poder de fato. Nós sabemos disso, mas não estamos enxergando a forma correta de nos mobilizar – principalmente para a esquerda, que damos mais importância ao que divergimos e deixamos de lado o que nos une.

Voltar os olhos para a base

Para muitos marxistas, as condições objetivas para uma ruptura maior com esse sistema – o nível de antagonismo, desigualdades, problemas sociais, etc. – já estão dadas; o que falta são as condições subjetivas – ou seja, a quebra com a alienação e o entendimento da realidade, compreendendo o nível de exploração que muitos são submetidos, para que poucos detenham o poder econômico, influenciem no poder político, e possam gozar de privilégios distantes da realidade dos brasileiros e brasileiras em sua maioria.

Compreendendo essa série de questões, se faz mais do que necessário voltarmos nossos olhos, mentes, corpos, prática e teoria para a base. Para quem pensa num mundo melhor, não há espaço que não deva ser disputado e ocupado. E, a capacitação da militância, e consequentemente a formação de quadros, são primordiais para que tenhamos êxito nessa caminhada. Temos muitas tarefas a serem cumpridas e poucas pessoas, diante da população em geral, para tocá-las. Enquanto não priorizarmos a formação de militância, continuaremos teorizando sobre como poderá ser um mundo melhor, nos focando principalmente no processo eleitoral – que é cheio de entraves para a conquista de pautas de nossas – , avançando muito lentamente nas demandas para quem mais precisa e, correremos o risco de, ao invés de fundarmos um sistema igualitário assim que o capitalismo estiver se esvaindo, deixarmos espaço para a edificação da barbárie.


(¹) A utopia nos serve como meta. É importante que tenhamos uma meta, para que se tenha um caminho, uma direção a seguir; e também para que não fiquemos ao sabor da maré ou dos ventos. É importante também saber observar a realidade de forma dialética, e não imediatista, para que saibamos enxergar os “atalhos” e “desvios” na nossa caminhada, até que se chegue ao nosso objetivo final.

(²) Boa parte das pessoas em 2011 – com a opinião capitaneada pela grande mídia – questionavam o pequeno aumento do salário mínimo, sem levar em consideração a formula de calculo adotada pelo governo federal para o mesmo (ver: http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/senado-aprova-minimo-de-545-reais ). Não vi até o momento uma auto-crítica contundente dos (“futurólogos”) meios de comunicação, nem dos Movimentos Sociais – e não foram poucos! – que compraram esse discurso.


Leno Miranda
Ciências Sociais - UESC
Coletivo 13 de maio
PT - Partido dos Trabalhadores
Ousar Ser Diferente
Esquerda Democrática Popular - EDP
Kizomba
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"A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar" (Eduardo Galeano)




"Cresci sob um teto sossegado,
meu sonho era pequenino sonho meu.
Na ciência dos cuidados fui treinado.
Agora, entre meu ser e o ser alheio
a linha de fronteira se rompeu."(Waly Salomão - Câmara de Ecos)

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