terça-feira, 24 de janeiro de 2012

A ressurreição da história

Lendo a entrevista de Francis Fukuyama na Folha de domingo, veio à mente uma reflexão. Uma vantagem de sermos juristas, ou se o leitor preferir algo menos pomposo, “estudiosos do Direito”, é que não precisamos o tempo todo demonstrar o quanto somos capazes de prever o futuro. Economistas e cientistas políticos, desafortunadamente, parecem não escapar desta tarefa inglória. Não que os juristas também não façam isso vez ou outra. Mas isso ocorre não como um dever, mas como uma excentricidade.

Já para os economistas e cientistas políticos quem sabe isso seja quase um dever, notadamente quando instados pela mídia a se manifestar sobre o porvir. Quando o cientista político se dedica de forma mais intensa à economia, então, os prognósticos tornam-se uma robusta análise pragmática e objetiva a respeito do que irá, fatalmente, acontecer. O problema é que em geral não acontece.

Assim parece que ocorreu com Fukuyama. Seu artigo intitulado “O fim da história?”, publicado em 1989, foi depois transformado em um livro de grande sucesso. “O fim da história e o último homem” é uma obra interessante e intelectualmente bem construída, em que pese de uma linearidade e de um elitismo por vezes desconcertantes. A própria concepção de história do autor é assustadoramente limitada e antiquada.

Ele mesmo faz questão de informar aos seus leitores que não havia sugerido o fim da “ocorrência de acontecimentos” (como se alguém, seriamente, tivesse considerado seus argumentos como o prenúncio do armagedon). Piora sua situação ao explicar-se dizendo que entende a história como “um processo singular, coerente e evolutivo”. E em assim sendo, conseguiria visualizar “uma história da humanidade, coerente e direcionada, que eventualmente conduzirá a maior parte da humanidade para a democracia liberal”. Afinal, tal modelo continuaria a ser “a única aspiração política coerente que se espalha por diferentes regiões e culturas em todo o mundo”.

E para finalizar com chave de ouro asseverou que “os princípios liberais da economia – o mercado livre – alastraram e conseguiram produzir níveis de prosperidade material sem precedentes, tanto nos países industrializados como naqueles que, no final da segunda guerra mundial, faziam parte do empobrecido Terceiro Mundo.” Não é necessário entrar em maiores detalhes da sua tese, embora existam outras afirmações realmente muito peculiares e talvez até, digamos, “constrangedoras”.

O fato que é nada disso é verdade. Várias críticas foram apontadas ao seu discurso na época (a comunidade acadêmica de esquerda não perdoou o professor), mas é preciso reconhecer que o autor estava correto no tocante ao consenso que havia se formado na transição da década de 1980 para a de 90 a respeito das vantagens do “neoliberalismo democrático”.

Todavia, dois erros sobrepostos acabaram por desmerecer o acerto: primeiro, tal consenso não duraria a eternidade (aliás, mal durou duas décadas); segundo, o consenso estava fundado em uma falsificação da realidade (infelizmente para os liberais, as experiências históricas conhecidas pelo homem demonstram de forma clara que alcançamos uma maior realização da dignidade e da felicidade em ambientes de forte intervenção política na economia e não o contrário). As experiências ruins do Estado moderno não desabonam suas conquistas.

Mas assim como Fernando Henrique Cardoso, e outros tantos defensores ligados ao conservadorismo liberal privatizante da década de 90 (assumidos ou não) o fato é que Fukuyama, agora, reviu seu vaticínio. Em entrevista à Folha confirmou sua recente virada rumo a certo intervencionismo, que denomina (desgraçadamente convenhamos) de “novo populismo”, segundo o qual defende uma “maior regulação estatal”. Até aí, nada de extravagante.

O fato que é ele faz isso negando que tenha dado uma volta de 180 graus em seus escritos anteriores. Afinal, responde ao entrevistador, “ainda acredita que a democracia liberal é o melhor sistema político”. Ora, esta crença banal não o tornaria tão famoso! A grande tese defendida pelo autor não foi a de que o liberalismo seria o “melhor” sistema, mas que ele era o último. Haja vista o fim das ideologias, o prognóstico levado a efeito em sua tese era a perene continuidade do consenso global em torno das idéias então hegemônicas.

Com sua renitência o professor Fukuyama perde uma grande oportunidade para dizer simplesmente que errou. Que a história não acabou. Que ainda está para nascer “o último homem”. Que estamos longe de saber o que fazer para vivermos, cada um e ao mesmo tempo todos, de forma digna e feliz. Ao contrário do que defendeu, nosso futuro não só precisa de mais de história, como terá.


(*) Doutor em Direito do Estado, pós-doutorando na Fordham Law School, Professor de Direito Administrativo da UFPR e Coordenador Adjunto do Programa de Mestrado e Doutorado em Direito da PUCPR. (e.gab@uol.com.br)


Fonte: http://cartamaior.com.br/templates/analiseMostrar.cfm?coluna_id=5414

A democracia, a confiança e as escolhas da esquerda

O que está hoje em jogo no coração da crise do euro já não é somente a sobrevivência de uma moeda nem mesmo a sobrevivência da integração europeia. É a sobrevivência da democracia. Pelas mãos de integristas que idolatram o equilíbrio das contas públicas como bem supremo, a gestão irresponsável desta crise está a levar à destruição dos fundamentos da democracia nos Estados europeus. Entrámos numa era de pós-democracia em que os critérios de legitimidade da governação e dos seus protagonistas deixaram de ser a expressão do voto popular para passarem a ser o alinhamento com o setor financeiro e a suposta capacidade mágica de “tranquilizar os mercados”.

Portugal é hoje um laboratório de experimentação dessas políticas neo-liberais apadrinhadas pelo FMI e pela Comissão Europeia e impostas como “inevitáveis” para uma suposta reconquista da confiança dos mercados. A retórica da confiança tem sido um dispositivo importantíssimo da conquista de hegemonia pela direita em Portugal como no resto da Europa. “O caminho é restaurar a confiança. Porque nós só vamos conseguir crescer quando os investidores começarem a acreditar na recuperação”. A fórmula, declinada em versões várias, mostra ao que vem: a dita confiança é seletiva, é a confiança dos “investidores”. E a estabilidade virá enfim quando os ditos “investidores” tiverem a confiança toda.

Neste discurso há dois silêncios estridentes. O primeiro é o que cala a desconfiança insuperável dos “investidores”. O segundo é o que cala a falta de confiança crescente dos “não investidores” no seu próprio futuro. Vamos por partes.

A confiança dos investidores é uma questão de fé. Está difícil, não se vislumbra, mas os crentes estão certos que um dia ela virá. E para antecipar essa vinda, os oficiantes do deus mercado oferecem os sacrifícios que forem necessários. E sobretudo os que forem desnecessários. Sacrifícios dos outros, claro, nunca dos próprios. E esse é precisamente um primeiro silêncio espesso deste tempo. O discurso da direita sobre a confiança faz-se para manter intocado algo que é, por definição, tudo menos digno de confiança: o primado dos mercados financeiros. É uma escolha ideológica disfarçada de imposição da História. Em vez de apontar para uma confiança sólida, socialmente partilhada, que implicaria medidas corajosas para poupar a sociedade às febres especulativas dos “investidores”, o que a direita nos vem dizer é que a confiança é algo reservado aos que vivem dessas febres, é a confiança deles a única que devemos salvaguardar. E que toda a política – isto é, todas as escolhas decisivas para a comunidade – se deve assumir como refém desse privilégio de alguns poucos.

Ora, o outro lado da confiança dos “investidores” é a perda de confiança dos “não investidores” na sua vida quotidiana e no futuro. Um trabalhador que vê o seu salário diminuído, uma bolsista que tem a sua precariedade laboral eternizada, um desempregado cujo subsídio para que descontou lhe é reduzido, uma reformada que deixa de receber parte da pensão já de si paupérrima – todos experimentam atónitos o incumprimento dos compromissos elementares que a sociedade tinha com eles estabelecido. Há um contrato em que assentaram as nossas vidas e que é rasgado súbita e unilateralmente. Que confiança podemos ter? Diz-nos a direita que, como em todos os contratos, a alteração substancial das circunstâncias pode ditar a sua alteração. Pois seja. Mas por que é que só dita para os “não investidores”? Por que é que essa alteração substancial das circunstâncias não pára de reforçar a satisfação de tudo quanto é vontade (real ou presumida) dos “investidores”?

Um estudo agora divulgado em Lisboa pelo Instituto de Ciências Sociais sobre a qualidade da democracia em Portugal contém uma conclusão preocupante: só pouco mais de metade dos portugueses acham que a democracia é preferível a um governo autoritário. Essa é a expressão maior da perda de confiança da generalidade das pessoas – os “não investidores” – em que lhes será permitido ter uma vida digna. Que o mesmo estudo revele que 89% dos inquiridos entende que o que é mesmo importante na democracia é haver um nível de vida digno para todos os cidadãos mostra as razões fundas da desconfiança crescente na democracia. Para os “investidores” isto pode até ser uma boa notícia – um Estado autoritário dá-lhes garantias acrescidas de confiança.

(*) Dirigente do Bloco de Esquerda, professor associado na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, na área de Relações Internacionais, e investigador do Centro de Estudos Sociais onde coordena o Núcleo de Estudos para a Paz.


Fonte: http://cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19429

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Quarta carta às esquerdas

As divisões históricas entre as esquerdas foram justificadas por uma imponente construção ideológica mas, na verdade, a sua sustentabilidade prática—ou seja, a credibilidade das propostas políticas que lhes permitiram colher adeptos—assentou em três fatores: o colonialismo, que permitiu a deslocação da acumulação primitiva de capital (por despossessão violenta, com incontável sacrifício humano, muitas vezes ilegal mas sempre impune) para fora dos países capitalistas centrais onde se travavam as lutas sociais consideradas decisivas; a emergência de capitalismos nacionais com características tão diferenciadas (capitalismo de estado, corporativo, liberal, social-democrático) que davam credibilidade à ideia de que haveria várias alternativas para superar o capitalismo; e, finalmente, as transformações que as lutas socias foram operando na democracia liberal, permitindo alguma redistribuição social e separando, até certo ponto, o mercado das mercadorias (dos valores que têm preço e se compram e se vendem) do mercado das convicções (das opções e dos valores políticos que, não tendo preço, não se compram nem se vendem). Se para algumas esquerdas tal separação era um fato novo, para outras, era um ludíbrio perigoso.

Os últimos anos alteraram tão profundamente qualquer destes fatores que nada será como dantes para as esquerdas tal como as conhecemos. No que respeita ao colonialismo as mudanças radicais são de dois tipos. Por um lado, a acumulação de capital por despossessão violenta voltou às ex-metrópoles (furtos de salários e pensões; transferências ilegais de fundos colectivos para resgatar bancos privados; impunidade total do gangsterismo financeiro) pelo que uma luta de tipo anti-colonial terá de ser agora travada também nas metrópoles, uma luta que, como sabemos, nunca se pautou pelas cortesias parlamentares. Por outro lado, apesar de o neocolonialismo (a continuação de relações de tipo colonial entre as ex-colónias e as ex-metrópoles ou seus substitutos, caso dos EUA) ter permitido que a acumulação por despossessão no mundo ex-colonial tenha prosseguido até hoje, parte deste está a assumir um novo protagonismo (India, Brasil, Africa do Sul, e o caso especial da China, humilhada pelo imperialismo ocidental durante o século XIX) e a tal ponto que não sabemos se haverá no futuro novas metrópoles e, por implicação, novas colónias.

Quanto aos capitalismos nacionais, o seu fim parece traçado pela máquina trituradora do neoliberalismo. É certo que na América Latina e na China parecem emergir novas versões de dominação capitalista mas intrigantemente todas elas se prevalecem das oportunidades que o neoliberalismo lhes confere. Ora, 2011 provou que a esquerda e o neoliberalismo são incompatíveis. Basta ver como as cotações das bolsas sobem na exata medida em que aumenta desigualdade social e se destrói a proteção social. Quanto tempo levarão as esquerdas a tirar as consequências?

Finalmente, a democracia liberal agoniza sob o peso dos poderes fáticos (Máfias, Maçonaria, Opus Dei, transnacionais, FMI, Banco Mundial) e da impunidade da corrupção, do abuso do poder e do tráfico de influências. O resultado é a fusão crescente entre o mercado político das ideias e o mercado econômico dos interesses. Está tudo à venda e só não se vende mais porque não há quem compre. Nos últimos cinquenta anos as esquerdas (todas elas) deram uma contribuição fundamental para que a democracia liberal tivesse alguma credibilidade junto das classes populares e os conflitos sociais pudessem ser resolvidos em paz. Sendo certo que a direita só se interessa pela democracia na medida em que esta serve os seus interesses, as esquerdas são hoje a grande garantia do resgate da democracia. Estarão à altura da tarefa? Terão a coragem de refundar a democracia para além do liberalismo? Uma democracia robusta contra a antidemocracia, que combine a democracia representativa com a democracia participativa e a democracia direta? Uma democracia anticapitalista ante um capitalismo cada vez mais antidemocrático?


Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal).


Fonte: http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=5402

Conselhos Estaduais de Comunicação: a Bahia inaugura uma nova etapa

Por Venício Lima*

O setor de comunicações inicia 2012 fazendo História (com H maiúsculo).

Criado pelo artigo 277 da Constituição Estadual (1989) e regulado pela Lei n. 12.212 de 4 de maio de 2011, tomou posse o primeiro Conselho Estadual de Comunicação Social (CECS) brasileiro no estado da Bahia, em solenidade no auditório do Ministério Público de Salvador, no último dia 10 de janeiro, [cf. “A Bahia sai na frente” e ver abaixo relação completa dos membros titulares e suplentes].

A instalação do primeiro CECS na Bahia, não deixa de conter certa ironia. O estado tem servido de exemplo histórico pelo acasalamento de oligarquias políticas tradicionais com grupos dominantes da mídia regional e nacional. Um dos maiores emblemas do “coronelismo eletrônico” continua sendo o ex-governador, ex-senador e ex-ministro das Comunicações, o já falecido baiano Antonio Carlos Magalhães.

Apesar disso – ou por causa disso – a Bahia foi pioneira na inclusão do CECS em sua Constituição Estadual (CE) em 1989. Dezenove anos depois, com ampla mobilização da sociedade civil, realizou sua 1ª. Conferência Estadual de Comunicação e definiu a regulamentação do artigo 227 como prioridade. Uma 2ª. Conferência Estadual foi realizada em 2009 e no início de 2012 o CECS-BA se torna realidade, quase 23 anos depois da promulgação da CE.

Abismo crescente
A tímida e enviesada repercussão do fato na mídia regional e nacional só confirma o abismo crescente entre a os grupos tradicionais da velha mídia e a imensa maioria da sociedade brasileira. Acostumados ao quase-monopólio de pautar a agenda pública e a influir decisivamente nas políticas nacionais e regionais do setor, resistem em perceber que o país mudou. E mais: fingem não compreender algumas das conseqüências do verdadeiro tsunami tecnológico expresso na internet, nos celulares e nas diferentes redes sociais virtuais que atinge as comunicações.

A inclusão da própria mídia entre os temas de debate público e a demanda por participação da sociedade organizada na formulação e acompanhamento das políticas do setor – como já ocorre em outros campos de direitos humanos fundamentais – é uma dessas conseqüências.

Exemplo a seguir
O funcionamento do CECS-BA, por óbvio, gera uma enorme expectativa.

Ele estará sendo rigorosamente observado pelos grupos de mídia dominantes que, apesar de parecer ignorá-lo, apostam no seu fracasso. Esperam confirmar a tese de que se trata de uma tentativa disfarçada de partidos e políticos “autoritários” para “controlar” a imprensa e institucionalizar a censura. Por outro lado, ele terá a oportunidade histórica de mostrar que a participação democrática da sociedade na gestão das políticas públicas de comunicações constitui, na verdade, uma garantia para a universalização da liberdade de expressão no caminho da positivação do direito à comunicação.

O funcionamento do CECS-BA também demonstrará que parte do empresariado do setor de comunicações da Bahia – aquela que participou de sua construção e que está nele representada – já se deu conta de que o diálogo e a negociação constituem instrumentos básicos para atender ao interesse público nas sociedades democráticas.

Ademais, espera-se, que o exemplo da Bahia seja finalmente seguido nas demais unidades da federação [cf. “CECS: Onde estamos e para onde vamos” ].

Primeiro naqueles estados – como a própria Bahia – governados por alianças lideradas pelo PT. O partido aprovou a recomendação de criação dos conselhos estaduais de comunicação em Congresso Nacional realizado em setembro de 2011. Agora é, portanto, a hora dos governos do Acre, do Distrito Federal, do Rio Grande do Sul e de Sergipe criarem as condições para a criação dos CECS [registre-se que este processo encontra-se avançado no Rio Grande do Sul].

Segundo, nos estados cujas Constituições já prevêem a criação e instalação dos CECS. Mais de duas décadas já se passaram desde a adaptação das Constituições Estaduais à Constituição Federal de 1988. Não há mais o que esperar.

Terceiro, naqueles estados que não incluíram os CECS em suas constituições. Basta uma iniciativa do legislativo para que as Assembléias estaduais tenham a oportunidade de corrigir a omissão.

Por fim, espera-se que a Bahia sirva também de exemplo ao Congresso Nacional que desde 2006 ignora a Constituição Federal e a Lei e boicota o funcionamento do Conselho de Comunicação Social previsto no artigo 224 [cf. “Cinco anos de ilegalidade”]

Tarefas e esperanças
Como todo avanço político, o processo de construção do CECS-BA teve que percorrer um longo caminho, repleto de dificuldades e desencontros. O seu funcionamento comprovará – ou não – o acerto de decisões tomadas e, claro, indicará as correções de rumo que se fizerem necessárias.

Por Lei o CECS-BA terá “caráter consultivo e deliberativo sobre sua finalidade de formular a Política Estadual de Comunicação Social, observados a competência que lhe confere o art. 277 da Constituição do Estado da Bahia e o disposto na Constituição Federal, reconhecida a comunicação social como um serviço público e um direito humano e fundamental”. Não é pouco.

O CECS-BA deverá, acima de tudo, comprovar que a participação institucionalizada de diferentes setores da sociedade, junto ao Estado, na formulação e acompanhamento das políticas públicas estaduais de comunicação social constitui um avanço fundamental para a consolidação democrática em nosso país.

MEMBROS DO CONSELHO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL DA BAHIA

A. Representantes do Governo

Secretaria de Comunicação Social (2)
Secretaria de Cultura
Secretaria da Educação
Secretaria de Ciência e Tecnologia e Inovação
Secretaria da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos
Instituto de Radiodifusão Educativa da Bahia – IRDEB

B. Representantes da Sociedade Civil

B.1 Titulares:

Entidade profissional de classe: Associação Baiana de Imprensa

Universidades públicas com atuação no estado da Bahia: Faculdade de Comunicação - UFBA

Segmento de televisão aberta e por assinatura comercial: TV Aratu

Representante titular do segmento de radio comercial: Grupo Tucano de Comunicação Ltda.

Empresas de jornais e revistas: Empresa Editora A Tarde S.A

Agências de publicidade: Rocha Propaganda e Marketing LTDA

Empresas de telecomunicação: SINDITELEBRASIL

Empresas de mídia exterior: Sindicato das Empresas de Publicidade Exterior do Estado da Bahia/SEPEX - URANUS 2

Produtoras de audiovisual ou serviços de comunicação: RX 30 Produtora Ltda.

Movimento de radiodifusão comunitária: Radio Comunitária Santa Luz Ltda.

Entidades de classe dos trabalhadores do segmento de comunicação social: SINJORBA

Veículos comunitários ou alternativos: Associação Vermelho

Organizações Não-Governamentais ou entidades sociais vinculadas à comunicação (3): Cipó Comunicação Interativa, Intervozes Coletivo Brasil de Comunicação Social e Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé

Movimentos sociais de comunicação: Associação Renascer Mulher

Representante de entidades de movimentos sociais-organizados (3): União Brasileira da Mulher, Central dos Trabalhadores do Brasil–CTB, e o SINTERP
Entidades de jornalismo digital: A S2R Comunicação Ltda.– Bahia Notícias

B.2 Suplentes:

Entidade profissional de classe: OAB - Seção Bahia.

Universidades públicas com atuação no Estado da Bahia: Universidade do Estado da Bahia-UNEB.

Segmento de televisão aberta e por assinatura comercial: TV Itabuna.

Segmento de rádio comercial: Tudo FM Ltda.

Empresas de jornais e revistas: Jornal Folha do Estado.

Agências de publicidade: CCA Comunicação Propaganda.

Empresas de telecomunicação: SINDTELEBRASIL.

Empresas de mídia exterior: Central de Outdoor.

Produtoras de audiovisual ou serviços de comunicação: Malagueta Cinema e Vídeo.

Movimento de radiodifusão comunitária: Abraço.

Entidades de classe dos trabalhadores do segmento de comunicação social: SINTTEL.

Veículos comunitários ou alternativos: Instituto Cultural Nego D’Água.

Organizações Não-Governamentais ou entidades sociais vinculadas à comunicação: UNEGRO, IDESAB e a ARCCA.

Movimentos sociais de comunicação: FNDC.

Entidades de movimentos sociais organizados: CUT, UJS e FETAG-BA.

Entidades de jornalismo digital: Notícias do Sertão.


(*)Professor Titular de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor, dentre outros, de Regulação das Comunicações – História, poder e direitos, Editora Paulus, 2011.

Fonte: http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=5406

Desafios e caminhos a seguir

Por Leno Miranda

"A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar"¹ (Eduardo Galeano)

Vivemos um período importante na história do nosso país. Após 500 anos de exploração desenfreada e submissão aos ditames externos, um partido – que é o maior instrumento político já construído por trabalhadoras e trabalhadores desse país – consegue colocar um operário na presidência da república. Sem sombra de dúvidas, a vitória de 2002 foi uma escolha acertada e uma conquista inegável para o Brasil - é só imaginar o que seria o país com a continuação da dupla “demo-tucana” no governo, com seu receituário neoliberal e sua mentalidade de aceitação colonizada, dando prosseguimento a políticas impostas, que fizeram com que os países “de primeiro mundo” quebrassem, hoje, com a crise mundial. O país avançou muito, principalmente no que diz respeito à atenção dada aos mais pobres e à inclusão social. Condições mínimas de dignidade foram garantidas pelo governo para quem mais precisa e, é visível que a vida das brasileiras e dos brasileiros melhorou.

Pela primeira vez na história temos mais de cinquenta por cento da população acima da classe média no Brasil. Enquanto o velho mundo e os EUA adotam medidas severas de austeridade – corte de gasto público, corte e diminuição de salários, demissão de funcionários públicos, aumento de impostos, corte de direitos trabalhistas, etc. – o Brasil, apesar dos atuais cortes de gastos públicos, vai aumentar significativamente o seu salário mínimo², não deixa de olhar pelo social e estuda corte de impostos. O desemprego bate recorde nos “países de primeiro mundo”, enquanto aqui a situação é praticamente inversa.

Porém, mesmo com os avanços conquistados, não podemos nos esquecer que ainda vivemos no modo de produção capitalista. Sistema esse que se constrói, dentre outras coisas, através do antagonismo explorados/exploradores, que ocasiona a acumulação de uma parte (minoritária) em detrimento da expropriação da outra. As tentativas de se “amenizar” os efeitos do capitalismo, ou de tentar “humanizá-lo”, são formas de, mesmo que não queiramos referendar a idéia de que “a exploração do homem pelo próprio homem” – e seus desdobramentos – continuem acontecendo.

As ruas do mundo, diante desta ultima crise financeira, apontam que as contradições atuais são tantas – principalmente nessa sua nova roupagem do capitalismo, o neoliberalismo - que o povo está se manifestando. A densidade política e financeira construída ao longo da história pelas potencias européias, e também pelos Estados Unidos - que submeteu todo planeta à exploração, em vários sentidos, para manter um nível de acumulação e poderio econômico, capaz de ditar as regras mundiais, disseminando miséria e desigualdade - está ruindo. A subserviência ao mercado está colocando em cheque o quanto é “perfeito” esse modo de produção. E, por mais que estejamos numa situação “confortável” (no Brasil) hoje, de uma forma ou de outra, essa crise iniciada no norte do mudo, ecoa também para o sul. Por isso, temos que nos preparar, pois as conseqüências podem ser grandes.

Observado isso, poderíamos dizer que estamos diante de outra oportunidade histórica: o Brasil, com sua importância na geopolítica mundial – que ganhou corpo depois do governo petista – poderia ser o pólo catalisador de uma “guinada à esquerda” na política (econômica) mundial. Mas, isso não é tão fácil quanto parece. Primeiro temos que fazer o nosso “dever de casa”, onde possamos garantir que algumas mudanças sejam aplicadas aqui, para que tenhamos um alicerce sólido e, servir de exemplo posteriormente para outros países.

“Dever de casa”

Para se pensar no socialismo, ou em uma sociedade igualitária – e, se a idéia for construir essa sociedade pelo viés democrático, passando pelo processo eleitoral – é necessário que se tenha maioria nos espaços de poder institucionais e, que também se tenha uma ampla aceitação popular ao projeto. A adesão das forças armadas também é importante nesse processo, haja vista o que aconteceu em 1964 – onde a intenção de Jango não era nem o socialismo – e, o apoio que Chavez recebeu na Venezuela em 2001 por parte do seu exército, quando aconteceu uma tentativa de golpe.

Vamos por partes. Primeiro vamos abordar a ocupação dos espaços institucionais – focando o executivo e o legislativo. É fato que tomamos a presidência da república há quase dez anos. Porém, não foi só um partido que conseguiu ganhar a eleição de 2002, foi uma coligação; e, mesmo que fosse só um partido que tivesse ganhado a referida eleição presidencial – fato muito difícil de acontecer – , quem está na presidência não governa sozinho – precisa ter, no mínimo, dois terços em cada câmara para “governar com tranqüilidade”.

O que acontece hoje para que se possa governar? Com base no que foi dito no parágrafo anterior, é necessário que se faça um governo de coalizão – para se ter o maior apoio e sustentação possíveis e se aprove as políticas necessárias.

Se formos fazer uma leitura de conjuntura do congresso nacional, veremos que dentro dos vieses ideológicos, que vão da ultra-direita até a ultra-esquerda, teremos um cenário em sua maioria conservador. Como política é a arte de lhe dar com a pluralidade, a pluralidade presente dentro do congresso tem uma boa parte conservadora. A base aliada do governo de Dilma é grande, por isso a mídia fala que ela tem poder para aprovar o que quiser. Porém, esta base é super heterogênea no sentido ideológico, tendo como maiores aliados numéricos os partidos de centro – que geralmente, para não falar sempre, são fisiologistas. Dentro dessa lógica, para governar tem que se fazer um arco de alianças tão grande – com partidos que tem interesses tão distintos ideologicamente dos nossos – que se consegue avançar minimamente nas bandeiras que a esquerda defende. Sem contar que, nos últimos tempos, devemos admitir que a correlação de forças dentro do congresso tem melhorado bastante, visto momentos anteriores.

Qual seria a solução dentro desse viés político-eleitoral? Conseguir eleger o executivo e, a maioria de esquerda no legislativo. No Brasil, só conseguiríamos isso com um amplo apoio popular, que possibilitasse inclusive fazer uma reforma política progressista. A melhor alternativa em relação a reforma política seria uma constituinte exclusiva – que era a proposta que o PT defendia até pouco tempo. Visto a conjuntura (conservadora) interna do congresso, se forem delegados aos integrantes daquelas casas a tarefa de fazer uma reforma política, corremos o risco de retroceder ao invés de avançar nessa área. O ideal seria que fossem feitas eleições para tanto e que outras pessoas, que não fossem parlamentares, tivessem a tarefa de elaborar essa reforma – dentro de uma série de critérios, inclusive ficar inelegível por 4 anos, para evitar ao máximo que o espaço se torne um palanque político.

Se observarmos com mais calma, veremos que até para se fazer a constituinte exclusiva, precisaríamos de muito apoio popular para aprová-la. Não seria de bom grado que a elite “se ausentaria” desse espaço. Uma grande mobilização nacional seria necessária para que conseguíssemos tal feito. E, a retrospectiva histórica não é animadora: no final da ditadura, onde a mobilização era bem maior do que hoje, a esquerda não conseguiu ter maioria na ultima constituinte e, chegou ao ponto não assinar a Constituição, que hoje é uma das leis, se não a lei, mais progressista do país.

A “pressão interna” no governo já existe – de diversos setores, como os partidos que compõem a base, a pressão da oposição, dos interesses privados defendidos por integrantes de diversos partidos, a pressão de empresas que ajudaram na eleição, etc. Todos os campos que compõem o governo, e quem apoiou as candidaturas, já fazem suas pressões constantes. Mesmo com a dedicação de muitos parlamentares, devido à correlação de forças, muitas vezes é difícil fazer frente a esses interesses. Seria necessária uma pressão popular grande, para que a “pressão externa” também exista de forma constante, forçando nossos representantes a tomarem medidas cada vez maiores em prol do social, e não na defesa de interesses privados.

Em suma, o que se percebe é que é na população em geral que encontramos o ponto de partida. É a sociedade que elege os representantes; é dela que os representantes saem; e (teoricamente) para ela que governam. O número de pessoas em toda sociedade é maior do que todo o aparato institucional. É a população quem detém o poder de fato. Nós sabemos disso, mas não estamos enxergando a forma correta de nos mobilizar – principalmente para a esquerda, que damos mais importância ao que divergimos e deixamos de lado o que nos une.

Voltar os olhos para a base

Para muitos marxistas, as condições objetivas para uma ruptura maior com esse sistema – o nível de antagonismo, desigualdades, problemas sociais, etc. – já estão dadas; o que falta são as condições subjetivas – ou seja, a quebra com a alienação e o entendimento da realidade, compreendendo o nível de exploração que muitos são submetidos, para que poucos detenham o poder econômico, influenciem no poder político, e possam gozar de privilégios distantes da realidade dos brasileiros e brasileiras em sua maioria.

Compreendendo essa série de questões, se faz mais do que necessário voltarmos nossos olhos, mentes, corpos, prática e teoria para a base. Para quem pensa num mundo melhor, não há espaço que não deva ser disputado e ocupado. E, a capacitação da militância, e consequentemente a formação de quadros, são primordiais para que tenhamos êxito nessa caminhada. Temos muitas tarefas a serem cumpridas e poucas pessoas, diante da população em geral, para tocá-las. Enquanto não priorizarmos a formação de militância, continuaremos teorizando sobre como poderá ser um mundo melhor, nos focando principalmente no processo eleitoral – que é cheio de entraves para a conquista de pautas de nossas – , avançando muito lentamente nas demandas para quem mais precisa e, correremos o risco de, ao invés de fundarmos um sistema igualitário assim que o capitalismo estiver se esvaindo, deixarmos espaço para a edificação da barbárie.


(¹) A utopia nos serve como meta. É importante que tenhamos uma meta, para que se tenha um caminho, uma direção a seguir; e também para que não fiquemos ao sabor da maré ou dos ventos. É importante também saber observar a realidade de forma dialética, e não imediatista, para que saibamos enxergar os “atalhos” e “desvios” na nossa caminhada, até que se chegue ao nosso objetivo final.

(²) Boa parte das pessoas em 2011 – com a opinião capitaneada pela grande mídia – questionavam o pequeno aumento do salário mínimo, sem levar em consideração a formula de calculo adotada pelo governo federal para o mesmo (ver: http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/senado-aprova-minimo-de-545-reais ). Não vi até o momento uma auto-crítica contundente dos (“futurólogos”) meios de comunicação, nem dos Movimentos Sociais – e não foram poucos! – que compraram esse discurso.


Leno Miranda
Ciências Sociais - UESC
Coletivo 13 de maio
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“Carrego pra onde vou
O peso do meu som
Lotando minha bagagem
o Meu maracatu pesa uma tonelada de surdez
E pede passagem” (Meu Maracatu Pesa Uma Tonelada – Nação Zumbi)




"A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar" (Eduardo Galeano)




"Cresci sob um teto sossegado,
meu sonho era pequenino sonho meu.
Na ciência dos cuidados fui treinado.
Agora, entre meu ser e o ser alheio
a linha de fronteira se rompeu."(Waly Salomão - Câmara de Ecos)

Balanços que não explicam nada

Os balanços de 2011 da velha mídia retratam fielmente sua incapacidade para dar conta dos fenômenos fundamentais do mundo contemporâneo – incluindo o Brasil e a América Latina.

Senão, vejamos:


O fenômeno mais importante e abrangente de 2011: o novo ciclo da crise capitalista, agora afetando diretamente a governos, que não poupa a nenhum governo do centro do capitalismo. Como se poderia explicar, sem uma visão crítica do capitalismo e dos seus mecanismos de crise cíclica? Como explicar se as sociedades norteamericanas e europeias seriam os modelos que deveríamos seguir? Como explicar se no centro da crise estão os sistemas bancários, o FMI, o Banco Central Europeu e o modelo neoliberal?

Como explicar que um governo que, tudo o que fez em 2011 foi correr atrás de ministros corruptos, herdados do governo Lula, tenha a mais alta popularidade de um governo no seu primeiro ano? Como explicar, se as políticas econômicas e sociais nao forma incluídas entre as pautas essenciais desse governo?

Como explicar que seu ídolo francês, Strauss-Kahn, praticamente escolhido pela velha mídia para dirigir a França, caia em desgraca em um episódio de alguns minutos apenas? Sabia-se desse aspecto da sua vida, mas como era o dirigente máximo do FMI e iria capitalizar o descontentamento com Sarkozy para fazer um governo super moderado, era melhor nao dar destaque, até que nao deu mais para segurar e terminou a carreira do seu ídolo.

No Oriente Médio finalmente surgiria a democracia, descoberta por jovens mobilizados pela internet. Os velhos ditadores – todos elogiados ate ali por essa mesma mídia - cairam e forma substituídos por democracias liberais. Nada disso acontece e forças muçulmanas ganham as eleições ou ocupam os novos governos provisórios desses países, demonstrando a distancia entre a realidade dessas sociedades e as ilusões dos liberais.

Toda a imoralidade do pais estava concentrada no PT, no governo Lula e nos seus aliados. De repente aparece um livro que revela as maiores negociatas da história do país, por meio da privataria tucana e a velha mídia nao tem o que dizer.

Convocados por todos os meios que dispunham, manifestações fajutas cantadas em prosa e verso como a versão cabocla dos “indignados”, tiveram vida curta e publico pequeno. Os brasileiros são corruptos? Se deixam comprar por alguns trocados do Bolsa Família? Dificil explicar.

A Argentina, governada por dirigentes tresloucados e corruptos, reelege sua presidente no primeiro turno, com três vezes mais votos do que o segundo colocado. Como explicar isso aos leitores?

O jovem, dinâmico e flamante dirigente da oposição, Aécio Neves, foi para os jornais não por seus vibrantes pronunciamentos com propostas para o país, mas pelo bafômetro, pela queda do cavalo e outras farras privadas.

FHC foi comemorado nos seus 80 anos, mas deu pra se pronunciar pelo abandono das camadas populares definitivamente pelos tucanos, pelo sugestivo lema I care e outras bobagens do ramo, mesmo se saudado como a mente mais lúcida da oposição.

O contingente cada vez menos de leitores dessa mídia ficou sem entender o mundo, mesmo se tivesse paciência de ler os balanços do fim de ano. Ficam esperando que o modelo econômico brasileiro imploda, que a inflação dispare, que o desemprego aumente, que o DEM não desapareça definitivamente, que o Serra e o Aécio nao troquem tabefes – pelo menos em publico – e que nao saia a CPI da Privataria.


Fonte: http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=1&post_id=854

O mundo do dinheiro e seus heróis

Por Emir Sader

Até um certo momento os ricos ou escondiam sua riqueza ou tratavam de passar despercebidos, como se não ficasse bem exibir riqueza em sociedades pobres e desiguais. Ou até também para escapar da Receita.

De repente, o mundo neoliberal - esse em que tudo vale pelo preço que tem, em que tudo tem preço, em que tudo se vende, tudo se compra – passou a exibir a riqueza como atestado de competência. Nos EUA se deixou de falar de pobres, para falar de “fracassados”. Numa sociedade que se jacta de dar oportunidade para todos, numa “sociedade livre, aberta”, quem nao deu certo economicamente, é por incompetência ou por preguiça.

Ser rico é ter dado certo, é demonstrar capacidade para resolver problemas, ter criatividade, se dar bem na vida, etc., etc. Até um certo momento as biografias que se publicavam eram de grandes personagens da historia universal – governantes, lideres populares, gênios musicais, detentores de grandes saberes. A partir do neoliberalismo as biografias de maior sucesso passaram as ser as dos milhardários, que supostamente ensinam o caminho das pedras para os até ali menos afortunados.

Todos dizem que nasceram pobres, subiram na vida graças à tenacidade, à criatividade, ao trabalho duro, ao espirito de sacrifício. Tiveram tropeços, mas nao desistiram, leram algum guru de auto-ajuda que os fez aumentarem sua auto estima, acreditarem mais em si mesmos, recomeçarem do zero, até chegarem ao sucesso indiscutível.

Seus livros se transformam em best-sellers, vendem rapidamente – até que vários deles caem em desgraça, porque flagrados em algum escândalo -, eles viajam o mundo dando entrevistas e vendendo seu saber que, se fosse seguido por seus leitores, produziria um mundo de ricos e de pessoas realizadas e felizes como eles.

Quem vai publicar um livro de um “fracassado”? Só mesmo se fosse para que as pessoas soubessem quais os caminhos errados, aqueles que nao deveriam seguir, se querem ser ricos, bonitos e felizes. O mundo do trabalho, da fábrica, do sindicato, dos movimentos de bairro, das comunidades – mundo marginal e marginalizado.

Programas de televisão exaltam os ricos, os bem sucedidos, as mulheres que exibem sua elegância, sua falta de pudor de gastar milhões na Daslu e nas viagens a Nova York e a Paris. Ninguém quer ver gente feia, pobre, desamparada, que só frequenta os noticiários policiais e de calamidades naturais. As telenovelas tem como cenários os luxuosos apartamentos da zona sul do Rio e dos jardins de Sáo Paulo, com belas mulheres e homens que não trabalham, no máximo administram empresas de sucesso. Os pobres giram em torno deles – empregadas domésticas, entregadores de pizza, donos de botecos -, sempre como coadjuvantes do mundo dos ricos, que propõem o tipo de vida que as pessoas deveriam ter, se quiserem ser ricos, bonitos, felizes.

Esse mundo fictício esconde os verdadeiros mecanismos que geram a riqueza e a pobreza, os meios sociais – os bancos por um lado, as fábricas por outro – em que se geram a riqueza e a fortuna, a especulação e a expropriação do trabalho alheio. Em que estão os vilões e os heróis das nossas sociedades.


Fonte: http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=1&post_id=856

As palavras e as coisas: sobre as ditaduras



Por Emir Sader

O flagrante dos otavinhos ao ter chamado a ditadura militar de “ditabranda” se repete no Chile. O governo neo-pinochetista de Sebastian Piñera aprovou no Congresso a substituição de ditadura militar por “governo militar” nos textos escolares e o de Pinochet de general e não de ditador. A trama fracassou lá também, mas deixa lições.

Que importância tem chamar as coisas pelos seus nomes? Dizer que ditadura foi ditadura e não ditabranda ou governo militar ou “regime autoritário” (como o chama FHC em suas análises)?

Chamar ditadura de ditadura é dizer que é o oposto de democracia. Dizer que se tratou de uma ditadura militar, quer dizer que as FFAA, como instituição, violaram as atribuições constitucionais, e assumiram o poder do Estado.

Chamar aquele regime de “autoritário” ou de “ditabranda” ou de “governo militar” é esconder sua natureza essencial: de governo imposto pela força das armas, derrubando a um governo legalmente constituído.

Quando os órgãos da velha mídia brasileira chamam Castello Branco, Costa e Silva, Garrastazu Medici, Ernesto Geisel, e Joao Figueiredo de presidentes ou de ex-presidentes e não de ditadores, está equiparando-os aos que foram eleitos pelo voto popular e escondendo seu caráter essencial de governantes apoiados na força das armas e não na vontade popular.

Esconder a natureza de ditadura militar serve para tentar esconder o papel que teve essa mesma mídia ao pregar contra o governo democraticamente constituído, alegando que preparava um golpe e caracterizar o movimento golpista como de “salvação da democracia em perigo”. O famoso “pega ladrão”, que serviu para acobertar justamente o que diziam que buscavam evitar: um golpe e a instauração do mais brutal regime que nossa historia conheceu, uma ditadura militar.

Chamam - como fez a própria ditadura, que eles apoiaram – os seus opositores de “terroristas”, a forma de desqualificar os que, ao contrário deles e contra eles, resistiram, lutaram contra a ditadura, jogando sua vida nesse embate. Alegam que os que lutavam contra a ditadura queriam instaurar aqui outro tipo de ditadura. Uma leitura de intenções muito particular de quem pregou o golpe militar alegando que ia ser dado um golpe militar. Enquanto que o que os militares, com seu apoio e conivência, realmente deram foi um golpe, instauraram uma ditadura militar e um regime de terror durante mais de duas décadas.

Chamar democracia de democracia e ditadura de ditadura, conta. FHC chamou a ditadura de “autoritarismo”, e a democratização do país simplesmente de luta contra “os resquícios autoritários”. A partir dessa visão, a democratização era uma operação política superficial, de tirar a maquiagem de um regime autoritário para que ele se tornasse democrático. Apenas desconcentrar o poder político em torno do Executivo e desconcentrar o poder econômico em torno do Estado, como foi a concepção de FHC, que terminou predominando no Brasil, em que as estruturas de poder – dos bancos, da terra, dos meios de comunicação, entre outros – não foram tocadas.

Assim, pelo que se entendia por ditadura – ou autoritarismo – se pode entender o que cada um entende por democracia. Se simplesmente a igualdade jurídica proposta pelo liberalismo ou se profunda democratização das estruturas econômicas, sociais, políticas, da sociedade.

Chamar as coisas pelo seu nome é mais do que um problema nominal. É nomear seu conteúdo, suas determinações sociais, suas características políticas. As coisas não se reduzem a seus nomes, mas os nomes designam – ou escondem – a natureza de cada coisa.

Fonte: http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=1&post_id=859

Explorando os limites de uma esquerda reformada

Zygmunt Bauman, na primeira carta do seu livro recentemente publicado no Brasil, "44 cartas do mundo líquido moderno" (Zahar, 2011, 226 pgs.), faz duas perguntas e apresenta uma conclusão provisória: "Como filtrar as notícias que importam no meio de tanto lixo inútil e irrelevante? Como captar as mensagens significativas entre o alarido sem nexo? Na balbúrdia de opiniões e sugestões contraditórias, parece que nos falta uma máquina de debulhar para separar o joio do trigo na montanha de mentiras, ilusões, refugo e lixo."

A pergunta de Bauman tem tudo a ver com a impotência das esquerdas, principalmente nos países capitalistas mais desenvolvidos, para dar respostas a uma crise que vinha sendo prevista por alguns economistas, há mais de dez anos. Vê-se que esta, depois de revelada, apresenta características diferentes, sociais e econômicas, das anteriores. Tanto daquelas do fim do Século XIX, na Europa e na Rússia, como daquelas que ensejaram a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, entremeadas pela crise aguda de 1929.

A compreensão destas diferenças é o que permitirá uma renovação do ideário e da estratégia da esquerda, em escala mundial, que atualmente se encontra em recesso conservador, como é caso da social-democracia. Uma outra parte da esquerda está fragmentada em milhares de pequenos grupos de idealistas, com causas confusas ou não raras vezes meramente corporativas.

Ambos os agrupamentos de esquerda identificam-se por estarem afastados dos cenários políticos onde se travam as batalhas pelos rumos da história: os cenários dos movimentos sociais de massas em defesa dos direitos prometidos pelas constituições modernas (teto, lazer, educação, informação livre, inclusão na sociedade de classes de maneira formal); e os cenários das disputas ideológicas com o projeto neoliberal, no âmbito da luta política democrática. A crise de personalidade da social democracia é, por outro lado, também uma crise da sua relevância na luta para ocupar governos e governar com coerência programática.

Suponho que as diferenças significativas para uma estratégia de esquerda, são aquelas que marcam os cenários, tanto nos países do centro do capitalismo como nos países "emergentes": primeiro, a rapidez com que as crises contaminam o cenário global é a mesma rapidez - com fundamento nas mesmas tecnologias informacionais - que permite a manipulação dos seus efeitos e a criação de hegemonias artificiais, para a universalização dos "remédios" anticrise; segundo, os trabalhadores do setor público e os trabalhadores assalariados de boa renda ou renda razoável, estão separados dos pobres das periferias, dos imigrantes, dos favelados criminalizados, desempregados, intermitentes ou precários. Estes constituem "ameaças", originárias de quem está excluído e cujas demandas, se aceitas pelos governos, podem exigir repartição de benefícios sociais e disputa pelos empregos dos que estão protegidos na formalidade.

Finalmente, uma terceira diferença substancial: as representações parlamentares dos partidos de esquerda livraram-se, em regra, daquela posição clássica de mera denúncia do "parlamento burguês". Substituíram, porém, esta ideologia da destruição do Estado por uma ideologia que faz, em regra, das bancadas de esquerda, mais uma soma de posições corporativas do mundo do trabalho ou mesmo de setores empresariais, do que uma síntese programática em defesa de um padrão desenvolvimento alternativo e de um novo conteúdo democrático para a república. Neste sentido, as delegações parlamentares de esquerda aproximam-se, perigosamente, da prática tradicional dos partidos cujo sentido é perpetuar uma burocracia parlamentar-profissional, alheia a princípios programáticos.

As transformações do capitalismo, que "cindiram" o campo dos assalariados e dos pobres, em geral, unificaram os "de cima, a partir da força coercitiva do capital financeiro e da ciranda especulativa. Ao mesmo tempo, estas transformações e a necessidade de manejo da dívida pública de maneira "responsável" aproximaram do estado, em geral, os grandes grupos empresariais de comunicação e os grandes oligopólios privados.

Os estados, premidos pela dívida, e as corporações de empresas em geral (donas ou reféns dos bancos) constituem hoje (unidos todos pelas algemas da dívida pública) um "estado ampliado". Por isso mesmo é, também, um estado que vem crescentemente renunciando as suas funções públicas originárias, inclusive aquelas de dar sustento, com juros subsidiados e aportes de infraestrutura, aos investimentos do setores produtivos estratégicos para o projeto nacional. Aqui, a lógica da globalização financeira e da dívida fala mais alto do que a ideia de nação, seja do ponto de vista do controle das riquezas naturais no território, seja do ponto da vista da formação de uma comunidade de destino que institui o "ethos" da nação.

O exemplo grego é emblemático. Não só no que se refere à "revogação" do referendo, feita pelo Banco Central Europeu, mas também no que refere às distintas reações políticas do mundo do trabalho, com suas diversas hierarquias públicas e privadas, para contestar o sacrifício das novas reformas.

Os trabalhadores, o povo grego em geral, os seus empresários nacionais, os seus setores médios empobrecidos, os seus agricultores, não apresentaram um programa alternativo de reformas, que implicasse numa nova relação com a União Européia. Não se uniram por uma saída alternativa para crise. Apenas "somaram" reivindicações de diversas categorias, públicas e privadas, de aposentados e pensionistas, de setores da indústria, sem compor um todo coerente em defesa de um novo modo de integração européia e de um novo estatuto de força para a comunidade política de esquerda, no âmbito da democracia, contra as tecnocracias financeiras. Os partidos que poderiam fazer isso, ou foram impotentes e fragmentários, ou foram coniventes ou omissos. Lembremos o que ocorreu na Grécia, na Espanha, na Itália, em Portugal...

Ao contrário do que ocorreu em outros períodos da História, nos quais os debaixo "pagavam" as crises com o desemprego e a recessão (na "destruição criativa" de que nos falava Marx), mas cobravam avanços sociais e, no mínimo, compartilhamento nas decisões de estado, no atual período -em cada crise- a esquerda sai mais enfraquecida. Uma parte dela já adotara os valores de uma desigualdade que seria modernizante e que, presumidamente, traria automaticamente melhorias para todos. A outra parte não construiu um programa de respostas, que instituísse uma nova correlação de forças política no plano interno (senão uma nova hegemonia), e ao mesmo tempo protegesse ou pelos menos sustentasse os direitos sociais já conquistados. A primeira parte da esquerda pulou o muro ou ficou encima dele e a segunda fez bravatas corporativas ou não tinha o que dizer.

Uma esquerda reformada não pode sair da tradição socialista, que, no atual período, significa concretamente opor a defesa dos direitos ao sucateamento dos direitos. Significa defender a globalização dos direitos sociais em conjunto com a globalização do capital. Defender a organização do consumo sustentável, combinada com a regulação social do mercado. Significa defender a solidariedade aos ex-países coloniais e a sua gente imigrada, opondo-se ao racismo e à xenofobia. Significa defender a estabilidade da democracia parlamentar e das instituições republicanas, combinadas com a participação direta e virtual da cidadania. Uma esquerda renovada defenderá políticas de desenvolvimento regional que partam da valorização da bases produtivas locais e da valorização das suas respectivas culturas. A esquerda renovada deve, enfim, repor no discurso político e nas ações de governo, a agenda do combate às desigualdades, tão cara à tradição socialista, social-democrata ou meramente republicano-democrática, que o neoliberalismo conseguiu arquivar.

O grande Giovanni Arrighi, falecido em 2009, chegou a ter esperança num mundo "não-hegemônico", cessados os efeitos da crise, em função da emergência da China e da policentralidade mais expressiva, que fatalmente adquiriria o capitalismo no período pós-crise. Tal mundo não se confirmou, lamentavelmente, mas as diferenças sul-norte, hoje, tem novas características políticas. As experiências latino-americanas de não aceitar passivamente as cartilhas neoliberais, embora as campanhas difamatórias contra todos os governos que se opuseram ao "caminho único", abrem novas perspectivas para o discurso e para as práticas de governo da esquerda.

A esquerda, agora, precisa derrotar a direita - além das derrotas eleitorais que já lhe infringiu - no terreno das ideias, no terreno da cultura política. Isso significa salvar a democracia, com um programa aplicável e realista cujo limite, ao mesmo tempo radical e amplo, é dar efetividade às promessas de justiça e igualdade, que estão no âmago das constituições modernas, tão duramente conquistadas ao longo de duzentos anos de lutas.

A derrota da democracia pela manipulação da informação, pela falta de crença popular na efetividade dos direitos que modernamente lhe caracteriza, pela destruição da esfera da política com a desmoralização de todos os partidos e das práticas de gestão democrática, seria a derrota final da idéia do socialismo. A partir daí só poderá sobrevir a anomia e a barbárie. Quem precisa, hoje, apelar para práticas clandestinas, nos obscuros porões das agências de risco, é a direita neoliberal e os seus servos na tecnocracia dos partidos conservadores.

No atual período histórico, finalmente, a democracia política, que era a cortesã escondida do socialismo, passa ser sua única companheira. Democracia e socialismo estão fundidos no programa de direitos e nas oportunidades de luta abertas firmemente pelas constituições democráticas.

(*) Governador do Rio Grande do Sul


Fonte: http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19318