Por Emir Sader
O ano, no Brasil, foi marcado pelas conseqüências da crise que chegou até nós na segunda metade do ano passado, e pela recuperação da economia, diante da forte ação do Estado, que induziu o consumo interno, dando continuidade às políticas de redistribuição de renda, com fortes efeitos sobre a demanda interna, e pela continuidade da demanda de importações chinesa.
Duas grandes novidades foram trazidas pela crise e a forma de sua superação: pela primeira vez nossa economia supera uma crise internacional, sem que a economia do centro do capitalismo – EUA, UE, Japão – tenha se recuperado, revelando a força dos intercâmbios do sul do mundo e o grau de diversificação do comércio exterior brasileiro. Em segundo, pela primeira vez, também, os pobres não arcaram com o ônus mais duro da crise: houve manutenção das políticas redistributivas, elevação real dos salários, continuidade da expansão do emprego formal, das políticas sociais.
Isso fez com que a popularidade do governo Lula tivesse uma pequena oscilação no transcurso da crise, mas se recuperasse espetacularmente de forma muito rápida depois e se consolidasse. É uma das referências políticas centrais, dado que logo depois das eleições municipais de fim de 2008, praticamente se abriu a conjuntura política das eleições gerais de 2010.
Praticamente tudo o que aconteceu no país foi sobredeterminado pela polarização governo-oposição, com as respectivas candidaturas ou pré-candidaturas. A oposição passa apenas com a candidatura do Serra, com continuidade de apoio nas pesquisas – mas já agora abaixo dos 40% -, um índice alto, embora com tendência declinante.
A desistência de Aécio e o programa do PT fizeram com que a campanha, já no fim de 2009, se anuncie como uma campanha plebiscitária em torno do governo Lula. Aécio é quem dizia que “não seria o candidato anti-Lula, mas pós-Lula”, indicando o incômodo de se enfrentar ao governo. Serra diz que vai enfrentar a Dilma e não a Lula – considerando que fosse possível fazer essa dissociação -, com quem trataria de se medir como trajetória política – considerando que a sua poderia aparecer como melhor do que a de Dilma.
A saída de Aécio confirma também a polarização partidária, que anunciava que poderia romper, ganhando a setores a base governista. O jogo do PMDB foi e continua sendo o de valorizar seu passe, tentar sentir se Dilma aponta para ultrapasar a Serra, mas confiante que a indicação do vice lhe garante o lugar de sempre na base governista.
O resto do campo eleitoral não deve ganhar relevância a ponto de evitar a bipolaridade. Se esgotou o impulso de crítica ao PT que a candidatura de HH explorou, a falta de entendimento com Marina impede somar forças, fazendo com esta e Plínio provavelmente sejam candidatos, tirando força de ambos. Marina já mostrou os limites do seu impulso, aceitando um lugar intranscendente e confirmando os limites do discurso verde, seja para polarizar apoios, seja para constituir, a partir dele, um discurso que seja suficientemente abrangente para disputar apoio mais alem de camadas médias urbanas, mostrando-se impotente diante do extenso voto popular que sustenta o apoio a Lula.
A oposição conta com campanha despolitizada, de marketing, em que as imagens dos candidatos predominem. O governo, com a retomada da polarização do segundo turno de 2006. 2010 será assim não apenas uma disputa eleitoral, mas de dois projetos de país: o de que Serra tenta esconder – sem revelar, por exemplo, sua equipe econômica, de política exterior e de políticas sociais, três temas de ruptura do governo Lula em relação ao de FHC -, e o de aprofundamento das transformações em curso, que Dilma deve encarar. Quem considera que o governo FHC e Lula foram iguais, não entende nada do quadro político atual do país, preferindo olhar da janela a banda passar, quando a fisionomia do Brasil na primeira metade do século estará em jogo em 2010.
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